
Pode-se afirmar que a principal causa dasenchentes nas cidades é a inexistência desistemas de escoamento que permitamaduzir certos volumes de água em determinado momentos.
Então, a culpa é das estruturas hidráulicas, da quantidade de água ou do modelo de urbanizaçãoda cidade? Na verdade, todas as três causas têm sua parcela de culpa, mas, por outro lado, todas podem fazer parte da soluçãodo complexo problema das enchentes.
Enchentes não são novidade em São Paulo. Um abaixo-assinado de moradores do bairrodo Bixiga, enviado à Assembleia Provincial em janeiro de 1850, dava conta dos prejuízos causados e pedia providências.
Após a grande enchente de 1929, toda a imprensa clamava pela urgência da retificação do rio Tietê. Em janeiro de 1987, o volume das chuvas foi 50% superior ao de janeiro deste ano.
Contudo, a quantidade de água só é problema quando, em curto espaço de tempo, elevados volumes atingem o ponto baixo da bacia contribuinte, causando vazões incompatíveis com os sistemas de escoamento, que transbordam e provocam enchentes.
É incontestável que o fato de as cidades ocuparem as várzeas dos rios – alterando a situação natural de escoamento da água e amortecimento de cheias –, somado à realidadeda impermeabilização das bacias, faz com que as águas cheguem rapidamente aos pontos mais baixos, o que é considerado uma das principais causas das enchentes.
Além disso, a mancha urbana da cidade deSão Paulo aumentou 11% em 33 anos, causando a impermeabilização das bacias. E o lixo acumulado nas ruas agrava o problema. Então, o que fazer agora?
Na busca de soluções para mitigar os impactos súbitos e severos das precipitações, uma alternativa é projetar estruturas hidráulicas que possam reconectar sistemas hidrológicose ecológicos, aumentando sua capacidade de lidar com repentinos aumentos de vazão.
Também é possível criar espaços para armazenar água durante e imediatamente após chuvas de grandes proporções. Os chamados piscinões, ou esponjas urbanas, reduzem o volumede água que chega no ponto mais baixo da bacia, diminuindo significativamente osi mpactos das inundações.
Outra solução pode ser o adensamento associado à verticalização. Esse modelo, que traz consigo vantagens do ponto de vista da otimização do transporte público e melhoria da mobilidade, evita a expansão desnecessária e prejudicial da mancha urbana, aumentando a área de absorção das águas de chuva por ocuparmenos espaço no solo.
Como os edifícios mais altos ocupam menos espaço nos terrenos, parte de sua área remanescentee seus subsolos podem e são utilizados para armazenar água durante o períododas chuvas, descarregando-as nas ruas posteriormente, de forma gradual.
Em função do nível de impermeabilização existente, estudo elaborado pelos professores da USP (Universidade de São Paulo) – o geólogo Álvaro Rodrigues dos Santos, o engenheiro Júlio Cerqueira Cesar e o arquiteto Nestor Goulart Reis – concluiu que se todos os terrenos na cidade de São Paulo onde não existem edifícios fossem verticalizados, seria possível reduzir a vazão das chuvas em cerca de 12% nos momentos de pico. Obviamente, essa não é uma proposta para a cidade, mas a constatação dos efeitos positivos da verticalização no que diz respeito à mitigação das enchentes.
A essas alternativas devem se somar outras, principalmente àquelas que preservem o que ainda resta dos sistemas de escoamento natural e, quando factível, recuperar aqueles que foram deteriorados.
*Presidente do Conselho Consultivo do Secovi-SP
11 de março de 2020