O frio e a garoa fina da segunda-feira, 11/5, não impediram que mais de 150 participantes acompanhassem o segundo dia do Seminário Jurídico Lei 13.097/2015 – Concentração dos Atos na Matrícula. Advogados especialistas em Direito Imobiliário trataram da proteção do adquirente na incorporação e no loteamento e a rescisão da promessa de venda e compra de imóvel.
Olivar Vitale, advogado do Conselho Jurídico do Secovi-SP e instrutor da Universidade Secovi, lembrou que, no Brasil, adquirir um imóvel ou lote exige demonstração de boa-fé e que as regras de conduta do indivíduo e os padrões sociais irão prevalecer nos casos de suposta fraude na negociação imobiliária. “O novo Código Civil trouxe uma visão mais humanista, com foco na conduta da honestidade, probidade e lealdade”, lembrou.
Vitale reforçou a intenção de a Lei 13.097/2015 proteger o adquirente de boa-fé e, também, de consolidar as jurisprudências nesse sentido. Os conceitos foram amplamente apresentados e debatidos em 4/5, quando aconteceu a primeira parte do Seminário Jurídico.
Dúvidas – O conteúdo do Art. 55 da referida Lei diz que “A alienação ou oneração de unidades autônomas integrantes de incorporação imobiliária, parcelamento do solo ou condomínio edilício, devidamente registrada, não poderá ser objeto de evicção ou de decretação de ineficácia, mas eventuais credores do alienante ficam sub-rogados no preço ou no eventual crédito imobiliário, sem prejuízo das perdas e danos imputáveis ao incorporador ou empreendedor, decorrentes de seu dolo ou culpa, bem como da aplicação das disposições constantes da Lei no 8.078, de 11 de setembro de 1990. (Vigência)”.
Para Vitale, o artigo prevê que: “Para existir proteção, a alienação de unidade em condomínio edilício ou lote tem de estar devidamente registrada, apesar de haver jurisprudência ao contrário”.
Assim como foi dito no primeiro dia do Seminário Jurídico, a Lei de concentração deixa vários questionamentos a serem esclarecidos. Vitale apresentou o seguinte exemplo para ilustrar as lacunas do instrumento legal, no que se refere ao uso dos créditos do empreendedor para pagamento de dívida de antecessor no terreno: “A incorporadora unifica cinco terrenos e registra a incorporação. Em determinado momento, surge o credor do proprietário de um dos terrenos vendidos. Primeiro, deve-se verificar se a satisfação do crédito está limitada ao valor do terreno ou, se a dívida for maior do que o valor do terreno, se o devedor tem outros bens”.
“Com as mudanças da lei, não fica claro se o loteador ou incorporador fica desobrigado de apresentar as Certidões Negativas de Débito (CND) recomendadas pelas Leis 4.591/1964, em seu artigo 32, e a 6.766/1979, no artigo 18. Se a ideia do artigo 55 da Lei 13.097 é constatar a idoneidade financeira do incorporador ou loteador, não faz sentido providenciar as certidões”, opinou Vitale.
Tempo ao tempo – Para Abelardo Campoy Diaz, advogado integrante das vice-presidências de Incorporação e Terrenos Urbanos e Habitação Econômica do Secovi-SP, as CNDs poderão ser dispensadas daqui a dois anos, quando a lei da concentração estiver em plena eficácia e, eventualmente, por ato da Corregedoria.
Campoy Diaz ressaltou que, para ele, o maior benefício da Lei 13.097 é que o credor não poderá embaraçar o negócio imobiliário, levando ao embargo das obras e ao cancelamento das vendas. “O imóvel com mácula de antecessor não impedirá o registro da incorporação e das vendas. A lei permite, inclusive, que unidades sejam alienadas para o pagamento do credor, sem prejuízo do Patrimônio de Afetação”, explicou.
No sentido de demonstrar a capacidade e idoneidade do incorporador, o advogado considera indispensável apresentar as certidões. “Nos loteamentos, embora desnecessárias as CNDs dos antecessores dos últimos 10 anos, a manutenção do artigo 18 da (Lei) 6.766, que pede essa diligência, fará com que alguns registradores ainda exijam esses documentos por um bom tempo. A eliminação do procedimento dependerá de uma orientação da Corregedoria para os cartórios”, disse Campoy Diaz.
Transparência – José Vicente Amaral Filho, advogado integrante do Conselho Jurídico da vice-presidência de Incorporação e Terrenos Urbanos do Secovi-SP e também da Mesa de Debates de Direito Imobiliário (MDDI) e da Comissão de Direito Imobiliário e Urbanismo da OAB/SP, disse que o artigo 55 da Lei de Concentração dá margem a várias interpretações, se analisado em conjunto às outras legislações do setor. E quanto mais evidenciado o problema do imóvel objeto da incorporação e noticiado, inclusive, no contrato de promessa de venda e compra, maior será a constatação de boa-fé das partes.
Para Amaral Filho, a citação de “dolo ou culpa” no artigo 55 pode ser objeto de exames e julgados prejudiciais ao incorporador. “No registro de incorporação em matrícula com ônus há dolo ou culpa do empreendedor? Vamos esperar o andamento dos fatos”, asseverou o advogado.
Sobre isso, Olivar disse que o artigo 55 não é um perigo para o incorporador. “Ele também o protege. Ele garante a continuidade do empreendimento, mesmo com alguns créditos caucionados.”
Campoy Diaz completou: “a boa-fé do incorporador não será questionada se ele for diligente, mas terá de assumir o ônus do credor, caso o devedor não tenha outro patrimônio para quitar a dívida à época da venda”. Para Vitale, havendo idoneidade financeira do incorporador e cumprido o que trata o artigo 54 da Lei 13.097, não há motivos para o registrador se recusar a registrar a incorporação, caso haja algum ônus na matrícula.
Rito processual – Passando para o tema seguinte, o superintendente jurídico da Brookfield Incorporações S.A., Rubens Leonardo Marin, falou que em caso de inadimplência de parcela de preços, o incorporador pode, unilateralmente, resilir o contrato de promessa de venda e compra de imóvel. “Poucos conhecem e usam esse mecanismo”, disse.
Marin apresentou as formas legais de se tratar o cliente inadimplente: por meio de negociação, de cobrança judicial ou leilão. Além do distrato, que é o acordo bilateral de desfazimento do contrato.
Conforme a nova redação do Decreto 745/1969, no caso de falta de pagamento do adquirente, após notificação com prazo de 15 dias para purgar a mora, é possível para a incorporadora rescindir o contrato unilateralmente. Isso é possível porque, na redação atual, o não atendimento da notificação acarreta o inadimplemento absoluto do comprador e não apenas sua constituição em mora. Marin recomendou o máximo de clareza na notificação do inadimplente. “Quanto mais claro o processo, maior a lisura e a afirmação de boa-fé.”
Entretanto, lembrou Marin, a lei ainda não resolve todos os problemas, pois há situações em que o contrato está registrado, ou o adquirente está na posse do imóvel, além da controvérsia quanto à devolução das parcelas.
Mudança de hábito – Roberto Wilson Renault, advogado do Conselho Jurídico do Secovi-SP, reforçou a importância da notificação correta do inadimplente e questionou: “o devedor pode purgar mora nos contratos rescindidos?”, completando que o Judiciário ainda vai demorar para mudar a forma de julgar e se desfazer da relação de hipossuficiência. Para ele, o melhor é tomar todas as precauções possíveis.
Rodrigo Bicalho, coordenador do Seminário Jurídico e advogado integrante do Conselho Jurídico da vice-presidência de Incorporação e Terrenos Urbanos do Secovi-SP, encerrou o evento dizendo que a alteração trazida no Decreto 745/1969 pela Lei 13.097/2015 está pronta para ser usada. Ela dispensa a ação judicial, que ocorre somente em situações específicas, como no caso de discussão sobre a devolução de parcelas, ficando, neste caso, a discussão restrita aos valores. “Cabe a nós, advogados, dar força à lei e usar os procedimentos legais existentes. Os juízes são os últimos a mudar seus hábitos.”
A participação no Seminário Jurídico rendeu 30 pontos para as empresas participantes do PQE (Programa Qualificação Essencial) do Secovi-SP, nas áreas de locação, compra e venda, administração de condomínios e loteamentos/associações de adquirentes de lotes. Mantenha-se atualizado e confira a grade de eventos e cursos promovidos pelo Secovi-SP, por meio do PQE e da Universidade Secovi.
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