Olivar Vitale*

A pandemia de covid-19 exigiu que quase todos fossem para o seu lar. As atividades mais comezinhas como tomar um café na padaria, ir a um jogo de futebol, ficar na fila do banco ou do cartório, simplesmente foram suspensas, sem data fixa para retornar.

Atividades essenciais, porém, não pararam e não podem parar. É o caso de transações financeiras, reuniões de negócios, a aquisição de imóveis e o seu registro no cartório competente, por exemplo.

A diferença é que é tudo on-line, eletronicamente. Com isso, focando no tema mercado imobiliário, catalisaram-se as providências para se ter a totalidade dos atos do setor imobiliário na modalidade eletrônica. Bem verdade que a possibilidade surgiu muito antes, com a MP 2.200-2/2001, as leis 11.977/2009 e 13.465/2017, os provimentos 47/2015 e 89/2019, ambos do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Tudo isso pré-pandemia.

Já em 18 de março deste ano, o Presidente da República promulgou o Decreto 10.278/2020, que estabelece a técnica e os requisitos para a digitalização de documentos públicos ou privados, para que esses produzam os mesmos efeitos legais dos documentos físicos. Mais recentemente ainda, tratou o CNJ de emitir os provimentos 94 e 95, válidos até 30 de abril de 2020, prorrogáveis enquanto subsistir a situação de Calamidade Pública.

Ambos são inovadores e ousados. Instituem, com grande novidade, o protocolo eletrônico de títulos (e-protocolo) durante a pandemia. Na prática, considerando-se que os cartórios de registros de imóveis estão com as portas fechadas, o e-protocolo permite que se dê entrada no documento para registro por meio totalmente eletrônico.

Além disso, inovam os mencionados provimentos ao permitir que o e-protocolo aceite a apresentação de instrumento totalmente digital, jamais tendo havido via física, desde que com assinatura certificada digitalmente pelas partes envolvidas; instrumento digitalizado diretamente da via física, mas assinado digitalmente; instrumento digitalizado em PDF, desde que confirmável eletronicamente em sites confiáveis; e ainda certidão digital gerada em PDF, uma vez assinada digitalmente pelo Tabelião.

É a revolução dos cartórios. É a transformação do que sempre foi físico e, também por isso, burocrático, em eletrônico. Empresas do setor já enxergaram isso e incorporadoras e loteadoras estão se estruturando para firmar contratos de promessa de compra e venda (PCV) por meio totalmente eletrônico, com os compradores decidindo pela aquisição, negociando e as partes assinando o documento de forma não-presencial. Isso é possível, legalmente válido e registrável com certificado digital, conferindo direito real ao adquirente.

Essa é a nossa realidade, em princípio até o fim da pandemia. Todavia, trata-se provavelmente de um caminho sem volta. Não amanhã, mas hoje! Plantões de vendas sem pessoas aglomeradas no mesmo local, compradores da casa própria realizando videoconferências com intermediadores, visitando apartamentos-modelo por realidade virtual e assinando digitalmente as PCV, algumas vezes com a participação também do Notário a certificar digitalmente a formalização da vontade, propiciando o registro do título no respectivo Cartório de Registro de Imóveis, tudo eletronicamente.

O aperto de mão, ato tão simbólico para fechar um negócio, foi abolido em razão da covid-19, mas o ser humano, criativo, rapidamente tratou de construir um ambiente virtual propício a fomentar as atividades imobiliárias.

*Advogado e membro do Conselho Jurídico do Secovi-SP

7 de maio de 2020