ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DE SÃO PAULO

 

Quinta-feira, 24 de julho de 2014.

  

No Brasil não há casos de condenação penal, embora a conduta seja tipificada

 

Da Redação: Marisilda Silva e Fernando Caldas Foto: Verena Glass/ Repórter Brasil

 

Trabalhadores no Canavial

 

O Estado de São Paulo possui legislação que pune com rigor a exploração de trabalho em condições análogas à escravidão. Sancionada em 28/1, a nova lei estabelece que empresas flagradas utilizando trabalho escravo perderão suas inscrições no Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), serão fechadas e não poderão realizar qualquer transação formal. A autuação vale tanto para as envolvidas diretamente quanto as beneficiárias indiretas. Atinge ainda os sócios envolvidos, que ficam impedidos de entrar com nova inscrição por dez anos.

A Lei 14.946/2013, aprovada pela Assembleia no final de 2012, concluiu uma etapa crucial para a sua aplicação efetiva com a sanção do Poder Executivo no dia 13/5/2013, do decreto que a regulamentou e estabeleceu as condições formais para a rigorosa aplicação das penalidades. Havia uma portaria editada em fevereiro pela Secretaria estadual da Fazenda que dificultava a punição das empresas, uma vez que o processo de cassação do cadastro do ICMS só poderia ser iniciado após condenação penal, transitada em julgado, de pessoa vinculada à empresa que tivesse feito exploração de trabalho escravo.

Segundo informações de auditores e procuradores do Trabalho, não há no Brasil condenação criminal pela prática desse crime (tipificado no artigo 149 do Código Penal). A lei aprovada em São Paulo atinge economicamente os que fizerem uso dessa prática. A lei contra trabalho escravo inovou ao prever restrições que acarretarão prejuízo àqueles que lucram com esse crime. O viés econômico trazido pela medida é uma de suas inovações. Deve, inclusive, influenciar na lógica do mercado paulista. “A criação dessa lei deverá inibir a concorrência desleal”, ressalta Luiz Carlos Fabre, procurador do trabalho.

A nova legislação foi motivada por uma série de denúncias feitas pelo Ministério Público do Trabalho sobre casos de trabalhos forçados no Estado de São Paulo. A Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de São Paulo apurou, nos últimos dois anos, diversos casos de trabalho degradante ocorridos em oficinas de confecção e no segmento da construção civil, envolvendo empresas renomadas desses setores.

 

Referência nacional e mundial

O coordenador do Projeto de Combate ao Trabalho Escravo da Organização Internacional do Trabalho (OIT) no Brasil, Luiz Machado, ressaltou que medidas como essas tornaram o Brasil “referência global no combate ao trabalho escravo”. A posição é endossada pela Organização das Nações Unidas (ONU), por sua relatora para Formas Contemporâneas de Escravidão, Gulnara Shahinian, que aponta a lei como referência mundial no combate à escravidão moderna.

A nova legislação paulista ganhou alcance internacional. Depois da sua oficialização, surgiram propostas de parcerias da ONG Free The Slaves para que medidas semelhantes a essa sejam aplicadas na África e na Ásia. Também foi firmado um termo de cooperação com o embaixador norte-americano do Escritório para Monitoramento e Combate ao Tráfico de Pessoas, para a criação de um fórum binacional, com bases em São Paulo e na Califórnia, reunindo especialistas e estudiosos no tema, para o subsídio de mais iniciativas no combate a escravidão contemporânea e a defesa dos Direitos Humanos.

Dados do Ministério do Trabalho de 2012 mostram que houve no país aumento de 14,37% no número de trabalhadores libertados em comparação com o ano de 2011. A fiscalização federal resgatou 2.849 trabalhadores em situações consideradas análogas à de escravo no ano passado. De acordo com informação do setor de inspeção do Trabalho, o aumento do número de resgatados deve-se ao fato de as ações fiscais terem sido realizadas em regiões não inspecionadas habitualmente e por ter ocorrido aumento no meio urbano do emprego desse tipo de mão de obra.

Esses trabalhadores foram encontrados em 255 ações fiscais realizadas em áreas urbanas e rurais pelas equipes do Grupo Especial de Fiscalização Móvel e de Grupos de Fiscalização das Superintendências Regionais do Trabalho e Emprego.

O Estado de São Paulo apareceu em quarto lugar no ranking divulgado pelo Ministério do Trabalho, que considera o número de resgatados nos meios rural e urbano. Foram 95 trabalhadores encontrados pelos fiscais no setor da construção civil que trabalhavam em situações consideradas análogas à de escravos. Em primeiro lugar está o Estado do Pará com 150 trabalhadores resgatados.

 

Fonte: Assembleia Legislativa de São Paulo

]]>