Depois de superar a marca de mil projetos certificados com o selo especial de construção sustentável, a maioria para prédios comerciais de alto padrão, indústrias, shoppings, hotéis, escolas e estádios de futebol, a indústria de construção verde avança no segmento residencial. A Green Building Council Brasil, uma ONG responsável pela disseminação no país das práticas de construção sustentável, através da certificação LEED (Leadership in Energy and Environmental Design), desenvolveu um referencial para “casas sustentáveis” visando promover a melhoria do nível técnico, também, no setor residencial.
Um dos primeiros projetos de construção alternativa, que recebeu o selo de Referencial GBC Brasil Casa, foi realizado pelo escritório paulista de engenharia LCP em Maresias, no litoral de São Paulo. É uma residência de alto padrão, de 1,8 mil metros quadrados de área construída, que utilizou como diferencial painéis de argamassa armada com miolo de poliestireno expandido (EPS), que substituem as paredes tradicionais de concreto ou tijolo. Foi construída em oito meses com economia de 20% nos custos de mão de obra.
A Fundação Vanzolini, criada, mantida e gerida pelos professores do departamento de engenharia de produção da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, igualmente incumbida da aplicação no Brasil dos critérios de construção sustentável já tem pelo menos a metade dos 305 empreendimentos certificados desde 2008, destinados a prédios habitacionais multifamiliares. Entre as edificações está a Reserva Anauá, em Pindamonhangaba, no Vale do Paraíba (SP). São 80 casas e 208 apartamentos, distribuídos em quatro prédios, ocupados por usuários de renda na faixa de três a dez salários, que contam com um selo verde – o Aqua-HQE, um modelo de certificação francesa adaptado no Brasil pela Fundação Vanzolini.
A perspectiva para os próximos anos é de um ritmo mais acelerado do crescimento da construção sustentável no país, avalia Felipe Faria, diretor da Green Building Council Brasil. Segundo ele, o Brasil está hoje em terceiro lugar no ranking mundial de empreendimentos LEED, atrás apenas dos Estados Unidos e China, com 878 projetos registrados e 182 certificados. “Há um processo de melhoria do nível técnico do mercado de construção civil. Aumenta a capacitação dos profissionais, que buscam fazer projetos integrados, realizar simulações econômicas e adotar soluções com eficiência energética ou uso racional de água”, diz.
O maior volume de certificações usando a metodologia LEED, que incentiva a transformação dos projetos, obra e operação das edificações, sempre com foco na sustentabilidade, é de edificações comerciais de alto padrão. Dois projetos recentes realizados pela São Carlos Empreendimentos, de São Paulo – o Edifício City Tower, uma torre de escritórios com 30 andares na rua da Assembleia, no centro do Rio, e o Centro Empresarial Região Portuária, na rua Venezuela, também no Rio, que receberam certificação LEED, são prédios com valor aproximado entre R$ 150 milhões a R$ 200 milhões, informa Marcelo Scarabotolo, diretor de operações da companhia. “São empreendimentos que vão gerar eficiência e uma economia na sua operação ao longo dos anos.”
Mas a tipologia das “edificações verdes” é bem variada. A BR Propertis, que possui 92 imóveis corporativos que totalizam 1,32 milhão de metro quadrados de área bruta locável, vários deles com certificação LEED, exibe como um dos marcos de sua atuação o projeto de restauração e preservação do Edifício Manchete, no Rio de Janeiro, que estava desativado. O prédio passou por um amplo e completo retrofit, transformando-o num edifício de padrão de eco eficiência Triple A. Considerado um patrimônio cultural, por ser obra de Oscar Niemeyer, o imóvel teve seus jardins e áreas verdes restauradas pelo escritório de paisagismo de Roberto Burle Marx, autor original do projeto.
Mas ganha corpo, a partir de agora, a adoção de critérios de sustentabilidade na construção residencial. Cerca de 80% dos mais de 30 empreendimentos lançados pela Even Construtora e Incorporadora na região metropolitana de São Paulo, desde 2012, com certificação Aqua-HQE, da Fundação Vanzolini, são edifícios residenciais. Alguns são apartamentos de 48 mil metros quadrados, com dois dormitórios, que custam de R$ 300 mil a R$ 5 milhões. “As concepções de todos os empreendimentos levam em conta os critérios de sustentabilidade e de eficiências energética”, conta Silvio Gava, diretor executivo da Even, que encerrou o segundo trimestre de 2014 com recorde de 16 projetos entregues – 3.491 unidades, somando R$ 913 milhões em VGV (Valor Geral de Venda).
Em Brasília, a Brasal Incorporações tem em seu portfólio cinco empreendimentos habitacionais concebidos seguindo o conceito de conforto e sofisticação da construção verde. “A principal característica das edificações é o uso da tecnologia como grande aliada das questões ambientais”, destaca Bruno Lima Goretti, diretor de engenharia da incorporadora. Entre as inovações, segundo ele, estão a adoção do sistema de energia solar para aquecimento de água, o uso de sistemas automatizado de controle de irrigação e iluminação, controle de acesso, e o controle de nível dos reservatórios, evitando desperdício de água e energia.
Para Manuel Carlos Reis Martins, coordenador executivo da certificação Aqua-HQE, na Fundação Vanzolini, o número de certificações no país, de modo geral, ainda é pequeno, pelo menos em relação a quantidade de lançamentos de imóveis realizados nos últimos anos. Mais, ainda, levando-se em conta os edifícios já existentes, que poderiam ser também avaliados e melhorados. “Precisamos continuar com essa disseminação da construção sustentável junto aos setores acadêmicos, empresários e também para o público. E o governo, igualmente, precisa tomar uma decisão e seguir também nessa direção”, afirma.
Fonte: Valor Econômico, Empresas, 27/08/14