Em artigo publicado no Estadão, o vice-presidente do Secovi-SP, Basilio Jafet, reflete sobre as lições que o mundo oferece e que o Brasil precisa aprender para aproveitar suas vantagens competitivas 

 

Basilio Jafet é vice-presidente de Relações Institucionais do Secovi-SP

Convencional, retrógrado, desatualizado, tradicional, conservador… Vários são os adjetivos que, não raro com lastro em preconceitos e ideologias, são empregados para definir o termo ortodoxo.

Acontece que ortodoxia, em sua essência, significa conformidade com uma doutrina ou crença considerada correta e que mostra bons resultados na vida real. É a adesão a um conjunto de princípios estabelecidos, muitas vezes de natureza religiosa, filosófica ou programática.

Quando levada ao contexto de políticas econômicas, ações tais como livre mercado, com pouca intervenção do Estado na economia; austeridade fiscal, com limitação dos gastos públicos, controle da inflação e busca de equilíbrio financeiro; abertura dos mercados; e taxa de câmbio flutuante têm revelado maior eficácia no decorrer dos últimos séculos. São, portanto, cognominadas ortodoxas.

Nações que adotam esse modelo têm proporcionado bons resultados aos seus cidadãos. O vizinho Chile é um arquétipo. Após a crise econômica da década de 1970, o país adotou um conjunto de reformas econômicas inspirado nas ideias de Milton Friedman – defensor do liberalismo e um dos economistas mais influentes do século XX -, conquistando crescimento econômico e controle da inflação nas décadas seguintes.

Embora seja necessário considerar inúmeras variáveis, percebe-se que os conceitos acima mencionados funcionam (e sempre funcionaram) bem no mundo como um todo. Países da Europa Ocidental – caso da Polônia, Hungria e República Tcheca – realizaram reformas econômicas apoiadas em princípios neoliberais para fazer a transição para uma economia de mercado. E países asiáticos, como Coreia do Sul e Taiwan, combinaram elementos de planejamento estatal com políticas de mercado.

Em paralelo, há uma miríade de países em que experiências heterodoxas deram muito errado. Grécia e Portugal, por exemplo, se reergueram após reorientar sua economia pelas premissas ortodoxas. A Argentina, após décadas de heterodoxias com resultados desastrosos, vai na mesma direção. Está pagando um preço expressivo, mas finalmente começam a aparecer resultados auspiciosos. Enquanto isso a Venezuela segue com foco no controle artificial dos preços, na nacionalização de empresas e no constante aumento dos desembolsos por parte do governo. A consequência é a falência da economia, dependente do auxílio de parceiros geopolíticos para sobreviver.

Gastar desenfreadamente e ampliar a dívida

pública estão na contramão do que têm

feito as nações, democráticas ou não.

É inequívoco que liberalismo e rigidez fiscal dão base ao desenvolvimento econômico e social sustentado, o que nos faz refletir sobre quais seriam os fundamentos atualmente ponderados pelo Brasil para resistir aos fatos e ignorar as lições que o mundo oferece.

Há décadas ouvimos que o Brasil será o ‘país do futuro’. Nossa democracia é consolidada. Possuímos um clima abençoado e não temos problemas étnicos, religiosos ou fronteiriços. Nossa produção agrícola é suficiente para alimentar quase um bilhão de pessoas e nossos recursos minerais podem abastecer o mundo por séculos. Além disso, contamos com um arcabouço legal que, malgrado suas imperfeições, funciona independentemente de injunções políticas dos governos de plantão, e oferece segurança ao investimento. A população superior a 212 milhões de pessoas, a maioria hoje consideradas de classe média, representa uma massa de consumo como poucas no planeta. Embora não se possa dizer que o Brasil seja 100% heterodoxo, as atuais práticas adotadas se mostram cada vez mais distantes dos princípios ortodoxos de sucesso, especialmente no que diz respeito aos gastos públicos irrefreados e à insistência em manter o peso do Estado na economia, renunciando, por exemplo,  à desestatização de empresas públicas – algumas sem qualquer razão para existir.

A opção pelo populismo fiscal, mostra a história, gera uma enorme conta a ser paga pelos cidadãos.  É como o cartão de crédito, cuja fatura do mês seguinte cobra o preço da inconsequência. Aconteceu antes e acontece agora, espelhada na forte desvalorização do real nos últimos meses, queda da bolsa, fuga de investimentos, alta da inflação e na necessidade de aumentar os juros para tentar evitar total descontrole.

Para impedir o avanço desse pernicioso processo, a saída é clara: responsabilidade fiscal na veia. Conter os gastos públicos, por meio de uma reforma administrativa de fato, o que, em nome do bem maior, exige uma concertação entre os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Ainda, seguir adiante nas reformas estruturais, incluindo a previdenciária, que precisa ser ajustada.

Medidas impopulares são como vacinas. Doem no momento, geram desconforto no dia seguinte, mas imunizam contra males que poderiam até ser fatais.

Gastar desenfreadamente e ampliar a dívida pública estão na contramão do que têm feito as nações, democráticas ou não. Abrem portas para a debacle econômica que leva ao colapso e penaliza os mais pobres.

O mundo está errado? É certo que não. Que saibamos, pois, aprender as lições que ele oferece para ingressar em um círculo virtuoso e bem aproveitar as vantagens competitivas do Brasil.

 

 

 

*Artigo publicado no jornal O Estado de S. Paulo em 5/2/2025 (Espaço Aberto – A5)