“Temos tudo para promover um modelo
alternativo de urbanização, com maior
adensamento, diversidade de uso e renda”
Hamilton Leite*

Quando os edifícios começaram a ficar mais altos, também começaram a surgir debates, regulamentações e estudos relacionadas à altura e ao adensamento construtivo.

O Código de Obras de São Paulo, de 1920, instituiu pela primeira vez regras para a construção vertical, e sua atualização (de 1929) estabeleceu uma altura máxima de 80 metros, que era consideravelmente elevada para aquele momento. Um dos ícones de São Paulo construído naquela época é o edifício Martinelli, que tem um aproveitamento igual a 22 vezes a área do terreno.

Mas, a partir de 1957, quando o coeficiente de aproveitamento (CA) foi limitado a 4 para edifícios residenciais, as regulamentações urbanísticas da cidade passaram a incorporar premissas contrárias aos edifícios altos, como os que existem em Nova York e Chicago, onde o CA situa-se entre 15 e 30.

Doutrinas restritivas têm predominado nos temas urbanísticos e influenciado de forma muito intensa as legislações em inúmeras cidades brasileiras. Todavia, após quase 60 anos, fica claro que isto não atendeu de forma efetiva aos objetivos inicialmente pretendidos e que já passou a hora de reverter essa lógica.

Quanto mais verticalizado o projeto, melhor é a ventilação e a insolação intraedifícios em todos os pavimentos e ao nível da rua, onde também é liberada mais área para lazer, convivência e vegetação (acesse a íntegra do trabalho em bit.ly/hl-jun20).

Esses espaços promovem o desenvolvimento da fauna urbana, melhoram a saúde da população e o microclima, além de aumentar a permeabilidade do solo, o que ajuda a reduzir alagamentos. Maior ventilação proporciona mais conforto higrotérmico de áreas internas e externas, ajuda na dispersão da poluição atmosférica e contribui para a redução da temperatura, que mitiga o efeito conhecido como ilha de calor.

Uma pesquisa conduzida pela NASA, em conjunto com a Universidade de Maryland, investigou quão sensível é a temperatura nascidades em relação à altura dos edifícios e concluiu que o efeito da ilha de calor é menor em regiões com predominância daqueles que são mais altos, em comparação com as possuem prédios mais baixos.

E quanto maior a densidade construtiva, maior é a oferta de imóveis, com a consequente redução do preço das unidades, tornando-as mais acessíveis a diferentes estratos sociais.

O espraiamento, que é a ocupação horizontal do território no sentido das periferias, é altamente prejudicial para a qualidade de vida dos moradores dos extremos das cidades, que precisam se deslocar aos seus locais de trabalho nas regiões mais centrais. O tempo precioso consumido diariamente nesse trajeto poderia ser usado no convívio familiar ou em qualquer outra atividade produtiva, de capacitação ou de lazer. Os deslocamentos pendulares também aumentam a poluição atmosférica, o consumo de combustível, de energia, e respondem por emissões de gases de efeito estufa que contribuem com as alterações climáticas.

Temos tudo para promover um modelo alternativo de urbanização, que permita maior adensamento e limite de altura determinado pela viabilidade econômica de cada projeto. Incluir famílias de baixa renda, hoje relegadas às zonas periféricas, e prover melhor qualidade de vida é tarefa inadiável. E viável. Basta considerar os resultados das pesquisas científicas mais recentes e remover os entulhos ideológicos.

*Executivo da UniSecovi, docente e mestre em Engenharia Civil e Urbana pela Escola Politécnica da USP

5 de agosto de 2020