O presidente do Secovi-SP, Basilio Jafet, participou de live no Instagram com o diretor geral do Procon-SP e secretário extraordinário de Defesa do Consumidor do Estado de São Paulo, Fernando Capez. A conversa aconteceu na noite dessa segunda-feira, 13/4, e girou em torno das preocupações e das demandas do setor imobiliário neste momento de exceção, provocado pela Covid-19.
Segundo Capez, existe uma série de conflitos potenciais acontecendo, envolvendo ou não as relações de consumo, mas que prejudicam as partes em momento de força maior. Citou como exemplo a questão entre locador e locatário, que não configura relação de consumo, mas requer bom senso. “Outro ponto relevante é a relação de compra e venda. A pessoa que comprou um imóvel e, de repente, perdeu parte do poder aquisitivo, o que faz com suas prestações?”, questionou.
O diretor do Procon disse que a situação é complicada. “Pela primeira vez, temos um evento de força maior, que afeta simultaneamente todos os contratos, em todas as áreas. Nenhuma das partes deu causa à interrupção do contrato, e também não teve culpa.”
Jafet reforçou que todos foram muito impactados com a crise. Lembrou que locatários residenciais hoje enfrentam redução no rendimento. E os comerciais, possivelmente, não estão podendo trabalhar. Mas, se deixam de atuar, como pagar o aluguel?
“Temos estatística de que 74% dos locadores são pessoas físicas, que usam suas economias para ter um imóvel, e dependem desse imóvel como única fonte de renda para enfrentar o dia a dia.” Pessoas jurídicas que locam muitas vezes venderam seus direitos (recebíveis) ou contraíram uma série de outros financiamentos para construir imóveis, considerando pagá-los por meio das locações.
“A situação é de difícil controle para todos”, afirmou, acrescentando que é necessário entender que as perdas devem ser divididas entre os envolvidos. “A recomendação é negociar, negociar e negociar. Não adianta endurecer de um lado ou de outro, senão vamos entulhar o Judiciário, arcar com honorários advocatícios e outros custos, além de ter de esperar muito tempo por uma decisão.”
Na avaliação de Capez, o coronavírus é evento de força maior, fortuito, que exclui o nexo causal, ninguém tem culpa. Qualquer ação judicial terá desfecho imprevisível, demorado e muito dificilmente resolverá o problema. Ou seja, será um caminho lento, difícil e caro.
“Nenhum doutrinador da área do consumidor, por mais gabaritado que seja. Nem há no Código de Defesa do Consumidor nada escrito para resolver uma situação como esta. É necessário resolver pelos princípios gerais do Direito: o da boa-fé e o do enriquecimento ilícito ou enriquecimento sem causa. Ninguém pode levar vantagem sobre o outro.”
Neste caso, de acordo com Capez, existe também o princípio da manutenção da base do negócio, segundo o qual se forem alteradas as bases em que o negócio foi feito, é necessário rediscutir as cláusulas. “Quando foi celebrado o contrato, havia uma determinada situação, e as bases se encontravam em outras condições. É fundamental rever as cláusulas, deixando claro que assim que a situação se normalizar, volta-se ao contrato original”, orientou o diretor do Procon, reforçando que não existe relação de consumo no contrato de locação. Ainda, afirmou que não adianta radicalizar, não adianta judicializar. “Secovi e o Procon podem ajudar no que for necessário.”
Basilio Jafet disse que o Secovi-SP está contribuindo ativamente com esclarecimentos, nas negociações e em tudo o que for chamado para colaborar. Lembrou que a entidade possui, inclusive, uma Câmara de Mediação que serve justamente para atuar nesses momentos. “De qualquer maneira, vale a orientação do Capez, ou seja, negociar com base na boa-fé, com bom senso. Estamos falando de um período curto de tempo que, ao final, poderá ser suspensa essa condição. Esperamos que haja um desfecho rápido.”
Compra e venda – Sobre o compromisso de compra e venda de imóveis, Fernando Capez questionou o presidente do Secovi-SP acerca da situação do compromissário comprador que teve a condição financeira alterada por conta da crise.
A orientação é a mesma: negociar é a melhor solução. O Secovi-SP recomenda que haja entendimento quanto aos pleitos de lado a lado. Segundo Jafet, cada empresa tem sua própria política. Eventualmente, se a pessoa não tem como pagar a prestação do imóvel, vai ser ouvida. Até porque, existe boa vontade das empresas em atender essas demandas. “Temos notado solidariedade muito grande nesse momento.”
Ele lembrou ainda o princípio citado por Capez, de que ninguém deve ter enriquecimento ilícito, mas ressaltou que as empresas também têm seus custos, despesas e compromissos que precisam ser honrados. Então, de novo, o bom senso deve imperar.
Orientação do Procon é pela manutenção dos contratos de compromisso de compra e venda, sendo que situações específicas serão analisadas individualmente, “sempre à luz do princípio da boa-fé”. Se não houver boa-fé, disse Capez, não haverá o direito, acrescentando a necessidade de transparência e também de respeito ao princípio da razoabilidade, com equilíbrio, serenidade e bom senso. “As obras podem atrasar, o que pode impactar nos contratos. Só sairemos dessa situação se tivermos harmonia.”
Em uma tragédia, afirmou, todos perdem um pouco para que todos possam ganhar. Informou também que o Procon está em uma cruzada implacável contra aqueles que agem de má-fé e querem aumentar seus lucros de maneira desproporcional. “Estabelecemos uma linha divisória: o fornecedor terá nossa compreensão, diálogo, mediação para uma solução harmônica, para que não haja quebradeira geral. Quem agir de má-fé, será responsabilizado, inclusive, criminalmente”, avisou.
De acordo com Capez, se houver quebradeira geral, em virtude de eventual radicalização, haverá consequências como a inviabilidade de reembolsar o consumidor, pois muitas empresas vão sair do mercado, diminuindo a concorrência e levando ao aumento de preços. “O Procon tem a preocupação de manter o equilíbrio dos contratos, o equilíbrio econômico.”
Nesse aspecto, seja para locação ou para compromissos de compra e venda, a avaliação é pela manutenção do pagamento, para não inviabilizar a obra e, consequentemente, o sonho de aquisição da casa própria. “Se houver atraso, deve-se usar o diálogo para chegar a um denominador comum. Procon e Secovi podem atuar em sintonia. Temos interesse comum na preservação da estabilidade do mercado para a defesa do consumidor. Sem isso, não haverá fornecedor.”
“É exatamente este nosso pensamento. Acrescento que os canteiros são considerados atividade essencial. Estamos tratando a questão da prevenção com muitíssimo critério. Só é admitida a presença de colaboradores fora do grupo de risco e sem sintomas. Além disso, uma série de providências foram adotadas, como separação de tarefas (distância segura entre trabalhadores), refeições em horários alternativos, horários de chegada e saída flexibilizados para os trabalhadores que utilizam transporte coletivo não fiquem sujeitos a aglomerações”, informou Basilio Jafet.
A expectativa é manter os canteiros em funcionamento e não ter atrasos. Porém, o setor depende de insumos para tocar as obras. Jafet disse que os materiais estão chegando e que houve problemas pontuais, até agora administráveis. “Esperamos conseguir manter o cronograma e o adquirente satisfeito.”
Outro negócio – O presidente do Secovi-SP aproveitou o momento para esclarecer outro ponto importante: “somos uma indústria, a indústria imobiliária, e nossos produtos são apartamentos e residências de todas as famílias que os adquirem, ou seja, nossos consumidores. Não somos especuladores”, ressaltou, acrescentando que o objetivo é atender o cliente oferecendo sempre a melhor qualidade e o melhor preço.
Jafet explicou ainda que a concorrência é muito grande, já que existem mais de 400 incorporadoras/construtoras atuando apenas no município de São Paulo. Por isso não dá para haver especulação. “Portanto, entregamos nosso produto como qualquer outro. Quem faz especulação são aqueles que compram o imóvel com a intenção de obter lucro com a valorização. Este é outro negócio, não é o nosso! Temos nossos custos, nossas margens de lucros e, a partir daí, é realizada a venda do produto.”
Resumindo – Partindo para o encerramento da live, Fernando Capez informou que vídeos com orientações sobre todos os contratos de relação de consumo estão disponíveis no site do Procon. Também relacionou os acordos firmados com companhias áreas, hotéis, agências de viagem e concessionárias de serviços públicos, entre outros. “Hoje, estamos falando sobre imóveis. Mas a linha geral de raciocínio é a preservação dos contratos e a utilização do direito do consumidor.”
Basilio Jafet reiterou a disponibilidade do Secovi-SP para subsidiar com opiniões e, junto ao Procon, ajudar a superar essa situação. Destacou a postura do órgão, na pessoa de seu diretor, em prol da solução de problemas. “Uma postura absolutamente proativa, abordando assuntos díspares com clareza e bom senso, sempre ouvindo todos os lados e falando uma linguagem clara, que todos entendem. Aprendi muito hoje e irei utilizar esse conteúdo com mais discernimento ainda.”
O diretor do Procon disse que elogios são estímulo para o órgão. E encerrou alertando que todos têm um compromisso com a segurança jurídica. “Nosso País não vai chegar a lugar algum com imprevisibilidade nas relações, com insegurança jurídica, com alteração de situações contratuais consolidadas depois de muito tempo, por que se descobriu determinado vício formal. Excessiva retórica, às vezes vazia, que só se presta à vaidade”, enfatizou.
“Pretendo organizar outra live sobre o mercado imobiliário, abordando outros temas, para informar mais pessoas. Com perguntas e respostas”, concluiu Capez.