O ano de 2021 foi marcante. Entre muitos desafios, tivemos boas notícias. O avanço da vacinação permitiu a retomada de várias atividades, movimentando a economia e ampliando a oferta de empregos.
Sob a ótica do mercado imobiliário, à primeira vista teríamos motivos para comemorar. Na cidade de São Paulo, do início de 2019 até agosto de 2021, o volume de lançamentos e vendas foi recorde – números jamais vistos no histórico da Pesquisa Secovi, que há anos acompanha o comportamento da área. As famílias de menor renda, enquadradas no programa Casa Verde Amarela, absorveram 50% das residências comercializadas.
O verbo ter no condicional se justifica. E não é “chorar de barriga cheia”. Não fossem as restrições impostas por legislações urbanísticas inadequadas, que encarecem o preço das moradias, poderíamos ter feito muito mais para reduzir o enorme (e vergonhoso) déficit habitacional.
Além disso, o motivo central desse desempenho – inflação e juros baixos – foi fraturado a partir de setembro, repercutindo diretamente nas vendas. Adicionalmente, o significativo aumento nos custos de produção, absorvidos no limite da capacidade pelas empresas e inevitavelmente repassados, restringiu o acesso à casa própria, num momento em que a ressignificação da moradia (que veio para ficar) aumentou a demanda.
Some-se a este cenário o fato de que o mercado imobiliário não é uma ilha. Está inserido no ecossistema da economia, em que boa parte dos setores produtivos (ainda que de forma heterogênea) começava a experimentar reativação quando o ambiente político (sempre ele) descompensou o ambiente dos negócios e dos investimentos.
Cabe a nós, integrantes dos setores produtivos, cumprirmos nosso papel de colocar as cartas, ou as condições de prosperidade, na mesa
Veio uma proposta de reforma do Imposto de Renda – a qual, espera-se, seja definitivamente arquivada – travestida de reforma tributária. Longe da simplificação desejada, a proposta só tumultuou e gerou crise de confiança. Depois, a PEC dos Precatórios colocou em xeque o respeito ao teto de gastos e, mesmo, à Lei de Responsabilidade Fiscal, ocasionando insegurança ainda maior, repercutindo no aumento da taxa cambial e da taxa Selic.
E é nesta esteira que caminhamos para 2022, com os problemas de sempre (sem reforma administrativa e outras estruturais, insegurança jurídica, falta de previsibilidade, etc.) e dificuldades novas, como a pandemia se estendendo muito além do imaginado e a imprevisibilidade gerada pelo cenário eleitoral. Em razão disso, os investimentos não vêm no volume desejado e, como consequência, deixamos de criar oportunidades e empregos.
Até agora, o debate eleitoral não contempla, com a profundidade necessária, a discussão de propostas para o País.
Essa sensação de vazio foi acentuada para quem visitou a Expo Dubai, onde todos os países (excetuando-se a Coreia do Norte) mostram o que planejam para suas cidades e seus habitantes em áreas fundamentais, como sustentabilidade (onde estava o pavilhão brasileiro), mobilidade e oportunidade.
A maioria das nações está firmemente empenhada em promover mudanças. A mobilidade equiparou-se à sustentabilidade. Um equilíbrio coerente. Afinal, o vaivém das pessoas tem impacto ambiental que precisa ser mitigado. Daí, inclusive, os projetos de cidades compactas, funcionais e amigáveis, coisa que o adensamento inteligente proporciona. São grandes transformações em andamento, alinhadas a compromissos assumidos na Conferência do Clima das Nações Unidas (a COP-26, realizada em Glasgow, Escócia). Infelizmente, o Brasil pouco apresenta que possa despertar interesse, atrair o olhar do investidor externo. Perdemos a chance. Mais uma vez. Quem não planeja não colhe.
A única coisa em que permanecemos pródigos é em perder tempo com temas triviais. Eles eclipsam o que importa de fato. E o fato é que precisamos de pessoas que pensem o Brasil. Não o Brasil do imediatismo das urnas, mas o que vem depois e vai além, alcança as futuras gerações, também cuidando daqueles que estão no presente. Ou será que não devemos medir as consequências do que ocorreu, por exemplo, no campo da educação? Conforme estudo realizado por Tribunais de Contas dos Estados, divulgado em 25 de novembro, um ano após o início da pandemia 10% dos estudantes do ensino fundamental (alunos dos 6 aos 14 anos) tinham abandonado a escola.
Qual é o plano para reverter essa situação? O que ela significa de atraso para a sociedade, para o desenvolvimento econômico e social? E quais as propostas para fixar o País como celeiro do mundo, entre tantas outras questões relevantes?
Enquanto isso, discutimos questões do Enem…
Cabe a nós, integrantes dos setores produtivos, cumprirmos nosso papel de colocar as cartas, ou as condições de prosperidade, na mesa. Sim, pois são os setores produtivos que têm voz para catalisar mudanças. Nossa história mostra isso. Com firme posicionamento, alicerçado integralmente no interesse nacional, precisamos sublinhar: o Brasil não aceita nem o como foi e nem o como é. Exige o como deve ser. Nada menos.
Basilio Jafet, presidente do Secovi-SP e reitor da UniSecovi