Cabe aos planejadores estudar formas de integrar o ecossistema arbóreo urbano, as vias e os edifícios

As condições microclimáticas diurnas são afetadas especialmente pela radiação solar, e o microclima em áreas específicas das cidades tem efeitos bastante perceptíveis, sobretudo no que diz respeito ao conforto térmico.

Para lidar de forma adequada com futuras condições climáticas urbanas, planejadores paisagistas e empreendedores imobiliários precisam de informações confiáveis ​​sobre as condições que afetam as mudanças no microclima, a fim de criar um componente de desenho urbano adequado à implantação do ambiente construído, da vegetação urbana e da arborização das ruas.

A aplicação de soluções baseadas na natureza nas cidades, para mitigar os efeitos nocivos do superaquecimento urbano, e tornar as cidades mais resilientes às ondas de calor, ganhou a atenção de urbanistas e pesquisadores nas últimas décadas. Neste contexto, projetos de arborização viária apropriadamente elaborados podem tornar-se ferramentas úteis para planejar o clima da vizinhança, resolvendo as interações entre edifícios, árvores, sistema viário e atmosfera.

Para melhor compreender esses efeitos, pesquisadores do Instituto de Ciências Ambientais da Universidade Autônoma de Barcelona, na Espanha, desenvolveram estudo para avaliar os efeitos da arborização das ruas no microclima em cidades compactas, onde a alta densidade de moradores urbanos e as intensas atividades de tráfego exigem que os planejadores urbanos se concentrem no desenho urbano para melhorar a regulação térmica.

Foram realizadas medições na cidade de Barcelona durante o verão, em dias sem nuvens, ao longo de duas ruas paralelas com diferentes densidades de árvores, mas geometria semelhante, registrando fluxos de radiação ascendentes e descendentes, temperatura e umidade do ar. Esses dados foram usados ​​para avaliar os impactos combinados da vegetação e das construções no microclima urbano.

Na comparação das temperaturas do ar observadas ao nível dos pedestres entre as duas ruas, foram observadas temperaturas do ar até 2,7°C mais altas na rua com baixa densidade de árvores, em comparação com aquela com árvores mais densas.

Dependendo das condições do vento, foi observado um aumento considerável da temperatura da superfície do pavimento, obtendo-se na rua com menor densidade arbórea temperaturas máximas diurnas em torno de 10°C superiores àquelas medidas na rua com maior densidade arbórea.

Foi constatado um maior fluxo de radiação de ondas curtas (de origem solar) na rua com menor densidade arbórea em comparação com a outra (150W/m2). A temperatura das paredes dos edifícios chegou a ser aproximadamente 2°C inferior nas ruas com mais árvores.

Os pesquisadores concluíram que o principal mecanismo que induz o resfriamento térmico das ruas deriva do sombreamento das superfícies do solo, especialmente no caso de materiais artificiais como asfalto e concreto, que possuem alta retenção de calor, e o correspondente redirecionamento de calor latente via transpiração.

O conforto térmico humano pode ser estimado principalmente a partir das condições meteorológicas ao redor do pedestre, ou seja, a temperatura do ar, a pressão do vapor d’água, a velocidade do vento e a temperatura radiante média. O estudo avaliou também o impacto das árvores nesse quesito.

Os resultados apresentados indicam que a arborização das ruas produz efeitos positivos claros na radiação e na temperatura do ar. Esses efeitos podem alterar as condições meteorológicas percebidas por um pedestre e melhorar seu conforto térmico.

Os efeitos positivos da arborização viária no microclima são bastante evidentes, mas cabe aos planejadores estudarem as melhores formas de fazer a integração perfeita entre o ecossistema arbóreo urbano, as vias e os edifícios, a fim de obter os melhores resultados possíveis dessa combinação, especialmente para os espaços urbanos que necessitam maior compacidade.

* Claudio Bernardes é vice-presidente do Secovi-SP

 

 

Artigo publicado na Folha Online em 23 de fevereiro de 2024