Éexatamente esta a pergunta que faço: por que os bancos dificultam amigração daquele crédito tomado que acabou ficando com juros mais altosque os de mercado? Hoje, qualquer financiamento bancário pode,legalmente, ser transferido de um banco para outro que mais convenha aotomador do empréstimo. É assim nos países de primeiro mundo. Se ofinanciamento do bem adquirido carrega taxa de juros mais alta do queoutro banco se dispõe a fazê-lo, a migração é livre porque prevista emlei.

Só que, hoje, ela é dificultada. E, no setorimobiliário, nem em prática está. Há até proposta, do executivo federal,de colocá-la em prática nos financiamentos imobiliários, o queestimularia a concorrência bancária e baratearia o custo de aquisição deimóveis. Mas a idéia não vinga. É preciso reverter isto.

Como a migração implica quitar o saldo devedor no banco financiador,há uma prática interbancária que define, nos contratos, uma taxa que,por ser estipulada unilateralmente, se comporta como tarifa (o grifo émeu) dificultadora da operação. Assim é que cada banco tem sua tarifa,já que tarifa é imposto, quando o artigo 52, parágrafo 2º, do Código deDefesa do Consumidor, estabelece que o consumidor tem direito à?liquidação antecipada do débito, total ou parcialmente, medianteredução proporcional dos juros e demais acréscimos?.

Osbancos alegam que tal taxa é indispensável ao equilíbrio financeiro docontrato em vigor, pois o dinheiro utilizado para aquele financiamentoteve um custo já assumido pelo banco. Ocorre que, quando se fala emtransferência de financiamento obtido com recursos do Sistema Financeiroda Habitação (SFH), tal argumento é falso, pois o custo da captação éregido pela lei 4380/64, absolutamente tabelado a juros fixos econhecidos, o que já terá garantido o lucro ao banco na concessão dofinanciamento.

A mídia noticiou, meses atrás, que,segundo pesquisa feita no Banco Central, o valor das taxas mais quedobrou entre 2006 e 2007, em se tratando de financiamentos de bens emgeral. Isso demonstra a liberalidade de tais procedimentos, mesmo àsvistas do BC. Lembre-se que dificultar a aquisição de imóvel, emespecial a casa própria, é infringir o que estipula a ConstituiçãoFederal, no seu Capítulo II ? Dos Direitos Sociais ?, o qual estabelecea moradia como direito dos cidadãos.

Importante:aqueles que buscam a migração não são apenas os que desejam baixar ocusto da moradia, mas também aqueles cuja carga de juros e outrosencargos financeiros impostos pelo financiador podem estarinviabilizando sua adimplência. A migração é, portanto, forma sagrada deatender à Constituição.

Carlos Alberto Etcheverry,desembargador em Porto Alegre/RS, mestre em Direito e integrante da 13ªCâmara Cível do TJRS, publicou meses atrás matéria no Jus Navegandi, emque mostra que o Ministério Público de São Paulo ajuizou ação civilpública contra um banco, na qual, entre outras disposições, foideterminado que a instituição se abstivesse de cobrar qualquer valorpara a liquidação antecipada de empréstimos pessoais.

Bem imóvel, em especial a moradia, é fundamental na estabilidadesocial e tem de ser respeitado. É propriedade e, como tal, jamais podeestar ameaçado por práticas que firam a legislação. Taxas e encargosfinanceiros excessivos que impedem a migração do crédito a outro bancolevam a efeitos sociológicos desastrosos. E, no concernente às classeseconomicamente menos favorecidas, é também fator de estímulo a invasõesde propriedades.

É evidente que aquele que quer pagar ojusto pela casa própria sinta-se injustiçado pelos que invadem imóveisirregularmente e lá permanecem sem nada pagar, valendo-se dosquestionáveis beneplácitos político-sociais. É a relativização dapropriedade. Como bem diz o filósofo Denis Lerrer Rosenfield em seulivro Reflexões sobre o Direito à Propriedade, esse direitoconstitucional tem de ser respeitado, pois é o fundamento para aliberdade que se deve impor em qualquer sociedade democrática.