Secovi-SP, Aesas (Associação Brasileira das Empresas de Consultoria e Engenharia Ambiental) e IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas) lançaram o guia “A produção imobiliária e a reabilitação de áreas contaminadas”, em evento realizado na sede do Instituto dia 26/4. O guia já está disponível para download gratuito.
Na abertura, Emilio Kallas, vice-presidente de Incorporação Imobiliária e Terrenos Urbanos do Secovi-SP, lembrou da antiga vocação industrial da cidade de São Paulo, que deixou, como parte de sua memória, grande quantidade de terrenos contaminados. “Agora, quando os incorporadores adquirem essas áreas contaminadas, adquirem também os passivos ambientais. E os investimentos são altíssimos para recuperar esses terrenos, fora o longo tempo de trabalho para devolvê-los à cidade”, enfatizou o dirigente, reforçando as boas intenções dos empreendedores imobiliários. “Em outros países, há incentivos para os interessados em recuperar áreas contaminadas. Infelizmente, mesmo seguindo os rígidos padrões estabelecidos pela Cetesb (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo), corremos riscos, porque sempre há a possibilidade de questionamentos por parte do Ministério Público”, disse Kallas.
O diretor de Controle e Licenciamento Ambiental da Cetesb, Geraldo do Amaral Filho, falou que a descontaminação do solo demorou para entrar no radar da sociedade, diferente de outros meios poluídos, como os rios. “Haja vista o arcabouço legal restrito, até pouco tempo, a poucos artigos dentro de outra lei”, ressaltou. De fato, a contaminação e remediação do solo urbano só foram estabelecidas legalmente em 2009, com a publicação da Lei nº 13.577. Nos quase 11 anos seguintes, o regramento foi ampliado, com a Decisão de Diretoria Nº 038/2017/C (DD38), e a Instrução Técnica Nº39/2017, ambas da Cetesb.
Amaral Filho lembrou que para se iniciar os debates de forma mais ampla, foi necessário surgir alguns casos críticos de contaminação do solo, como o da Vila Carioca, na zona Sul de São Paulo, apesar de a Cetesb ter identificado inúmeras áreas contaminadas nos anos 1980. “O setor imobiliário foi o primeiro a perceber a importância do regramento, a fim de se criar a possibilidade do uso racional dessas áreas”, ressaltou.
Decerto que avançar no conhecimento do assunto ajuda na recuperação das áreas. No entanto, ao estabelecer regras claras para se trabalhar nessas áreas, empreendedores e técnicos têm esbarrado em avaliações passionais e nada científicas, como lembrou o diretor da Cetesb. “A DD38 estabeleceu o que foi possível no que se refere à reutilização de áreas, a fim de dar novos usos a esses espaços, promovendo, com baixos custos para o Estado e a sociedade, o fim do abandono das áreas e a total degradação ambiental”, disse Amaral Filho.
Em São Paulo, há muitas áreas degradadas ambiental e socialmente, e para recuperá-las, de acordo com o diretor da Cetesb, é preciso mudar o conceito desses espaços dentro do planejamento urbano. A DD38 criou estímulos à revitalização e vem ao encontro do estabelecido em Lei para a recuperação de áreas, com a definição de prazos e a criação de condições para melhorar os espaços urbanos. “Ela traz o passo a passo do que precisa ser feito, é uma receita de bolo. Esse foi o nosso objetivo”, disse Amaral Filho, completando que o empreendedor é a própria garantia e segurança da conclusão da remediação. “Ele faz a gestão pelo risco.”
Rumo – Marcela Maciel de Araújo, do IPT, apresentou os capítulos do guia, que é voltado para leigos e foi elaborado com linguagem simples. “O Secovi-SP sentiu a necessidade de oferecer suporte ao pequeno e médio empreendedor imobiliário, com subsídios técnicos para colaborar com a tomada de decisão.”
O guia está estruturado em oito capítulos, e traz cases de descontaminações realizadas nos Estados Unidos, relação das áreas contaminadas no Estado de São Paulo e os contaminantes identificados, metodologia para o gerenciamento de áreas contaminadas, dentre outras orientações.
Rivaldo França de Mello Júnior, da Aesas, apresentou alguns aspectos técnicos contidos no guia, metodologias e sequência de gerenciamento das áreas contaminadas, que são os estudos básicos. “Requalificar áreas contaminadas é mudar a economia da cidade.”
Para Rodrigo Bicalho, advogado do Conselho Jurídico do Secovi-SP, o guia é mais um passo no caminho de aprendizado acerca do assunto e que a publicação desmistifica todo o processo de requalificação de áreas para as pequenas e médias empresas. Ele voltou a explicar que o empreendedor imobiliário não é responsável pela contaminação, até adquirir o terreno, e que o embate sobre a remediação integral da terra esbarra na impossibilidade técnico-científica de fazê-la. “O setor imobiliário não foi responsável pela contaminação e só entra nessa se tiver segurança jurídica e benefício econômico”, ressaltou.
Depois da remediação integral do terreno, o Ministério Público está defendendo uma nova tese: que o empreendedor faça a requalificação até o nível que for possível e indenize a sociedade com o pagamento de uma multa, cujo valor obedece a um determinado cálculo, com resultado financeiro incapaz de ser assumido por quem quer que seja.
Bicalho recomendou que as empresas interessadas em comprar terrenos contaminados sigam todas as etapas da DD38, da Cetesb, informe claramente as condições do empreendimento na matrícula, no contrato de compra e venda, no memorial de incorporação, na convenção de condomínio e nos manuais do síndico (áreas comuns) e do proprietário.
“Há precedentes no STJ, com pagamento de indenização por omissão de informações, abatimento no preço do imóvel e até mesmo distrato, com devolução de tudo o que foi pago. Não há demérito em ter um empreendimento em área reabilitada”, disse o advogado.
Emoção – O evento foi encerrado com provocações dos debatedores. O coordenador do Conselho Jurídico da presidência do Secovi-SP, Marcelo Terra, mencionou a “nuvem ideológica emocional” que está pairando sobre temas importantes para a sociedade, como o da remediação de áreas contaminadas. Ele disse que há uma falsa impressão de que o incorporador se aproveita da contaminação da terra para pagar muito menos pelo insumo degradado. “Isso é absolutamente falso na vida prática. Hoje, os contratos têm capítulos destinados às questões de meio ambiente e isso é muito difícil de ser explicado aos pequenos donos de terra. O embate entre proprietário do terreno e o incorporador fica difícil e gera incertezas na negociação.”
Alexandre Magno de Sousa Maximiano, da Aesas, falou da importância de se discutir objetivamente o financiamento de empreendimentos em áreas remediadas e que se o guia não for o primeiro a fazer isso, é uma das primeiras publicações a se propor a tratar do assunto a partir desse viés. “Ele vai dar um up date para a incorporação e auxiliar as indústrias.”
Ana Paula Dominguez da Costa, da incorporadora Bueno Neto e grande colaboradora na elaboração do guia, falou da intenção de levar para o material elementos práticos do dia a dia, desde a compra do terreno até a obtenção do laudo de reabilitação.
Nestor Kenji Yoshikawa, do IPT, destacou o papel de conciliador desempenhado pelo Instituto junto aos atores envolvidos com a causa e da consulta aprofundada feita junto ao banco. “O guia incentiva os empreendedores a aquecer o mercado, a transformar o passivo ambiental em negócio. O IPT preocupa-se com a tecnologia e teria o papel de desenvolvê-la. Mas como viabilizá-la economicamente”, questionou, dizendo que é preciso usar a tecnologia disponível oferecida pelas empresas.
Eduardo Della Manna, diretor do Secovi-SP e moderador dos debates, lembrou da importância das áreas contaminadas para o Estado de São Paulo, pois falta terra para se construir novos empreendimentos e reforçou que 50% das áreas antes contaminadas e hoje reabilitadas resultaram do trabalho dos empreendedores imobiliários. “E com esse guia, o Secovi-SP cumpre seu papel de qualificar esse empreendedor.”