A instabilidade caracteriza o mercado de ações. Para investir nele é preciso sangue-frio. Sem isso, a qualquer oscilação (o que tem sido recorrente, em especial após a crise do subprime norte-americano) o investidor corre o risco de prejuízos. Aliás, isso também pode ocorrer em momentos de euforia: vai-se no estouro da manada e depois se descobre que, houvesse um pouco mais de cuidado e observação, seria possível fazer um negócio melhor.
Quando, em 2006, empresas do setor imobiliário tiveram sua estréia no mercado de ações – os IPOs no Novo Mercado da Bovespa -, a sensação era extremamente positiva. Graças à estabilidade monetária e às medidas governamentais que resultaram num novo marco regulatório (que ampliou as garantias a compradores e agentes financiadores), o mercado de imóveis renasceu. O crédito imobiliário voltou a ser oferecido e a demanda reprimida começou a ser atendida. Para se ter uma idéia da proporção desse “renascimento”, na década de 90 e no início da atual, o Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE) – que reúne bancos que concedem empréstimos com recursos da poupança – financiava 50 mil unidades/ano. Em 2006 o total foi de 114 mil unidades; em 2007, 192 mil (um crescimento de 72%); e para este ano a previsão é de pelo menos 280 mil imóveis.
Ao lado desse incremento, cresce o número de famílias aptas a adquirir a casa própria. Temos a nova classe média brasileira ansiosa por comprar e, agora, com linhas de crédito mais acessíveis. E uma população de menor renda também se capacitando, graças à atuação das empresas, cada vez mais focadas nos empreendimentos chamados econômicos, e ao aumento dos recursos do FGTS para esse fim, embora a burocracia se constitua em dificuldade adicional, retardando os trâmites da Caixa Econômica Federal.
Tudo converge para se acreditar que investir em ações imobiliárias é risco aceitável. É verdade na maioria das situações. Será certo em 100% dos casos?
O que queremos dizer com essas frases, talvez conflitantes? Que estamos em meio a um processo que levará à consolidação do setor imobiliário em bolsa de valores. Na verdade, o aprendizado está sendo célere.
De um lado, empresas imobiliárias – em boa parte familiares – estão aprendendo com as boas práticas da governança corporativa. Faz parte desse aprendizado o cenário de reposicionamento de várias empresas. A alta especialização e a solidez exigidas pelas companhias de capital aberto vêm mudando a cara do mercado, que tende a uma atuação nacional. Isso explica as fusões e aquisições a que temos assistido – algo que consideraríamos natural se estivéssemos no exterior, onde a prática já cuidou de moldar a tradição.
Por outro lado, também o mercado de capitais está aprendendo como funciona a indústria imobiliária, um setor de longo prazo, em que ansiedade e precipitação não têm lugar. Os analistas estão-se familiarizando com as particularidades.
Enquanto um mercado aprende com o outro, como fica o investidor? Com serenidade não haverá perdas. Para começar, suas ações estão, de certa forma, lastreadas em ativos reais. São terrenos, imóveis. O novo arcabouço institucional da indústria imobiliária, com a alienação fiduciária e o patrimônio de afetação, emprestou adicional segurança ao setor. Graças ao novo marco regulatório, em vigor desde 2005, há salvaguardas muito modernas. E no que se refere a imóveis prontos, o lastro é sólido e a liquidez, cada vez mais consolidada, por conta da titularização por meio de fundos de investimentos e participações, recebíveis imobiliários, etc.
Imóvel não é papel ao vento. É bem de raiz e sua análise não se pode basear nas aflições geradas pela volatilidade do mercado de capitais. Como ilustração, o balanço – que analisa a atratividade de uma empresa – não reflete fielmente a carteira de recebíveis dos empreendimentos de longo prazo. Isto mostra que a “preocupação excessiva” que se instalou no mercado em relação às empresas imobiliárias poderia ter sido evitada com um olhar mais especializado sobre a condição de uma ou outra incorporadora. A generalização que se criou não beneficia ninguém.
É importante também considerar que a rentabilidade dos IPOs imobiliários no País está sendo injustamente contaminada pela instabilidade do ambiente internacional. Cerca de 70% dos investidores nos papéis de incorporadoras e construtoras nacionais são do exterior. São grandes grupos que acreditam no potencial do mercado de imóveis brasileiro, em seus bons projetos e realizações.
Naturalmente, em turbulências como a atual, esses investidores fazem de tudo para reduzir as violentas perdas geradas no mundo pelo subprime norte-americano. Buscam, então, zerar posições internacionais líquidas – tais como nossas ações -, para minimizar prejuízos em seus respectivos países. Mas isso nada tem que ver com o desempenho das empresas brasileiras, que é forte e promissor.
A parceria mercado de capitais-mercado imobiliário, no Brasil, está apenas começando. Os novos parceiros ainda não conhecem plenamente as características um do outro, suas especificidades. Aos poucos, a convivência vai nivelando a relação e as dúvidas são dissipadas.
O que dizer ao investidor? Que invista, com a mesma cautela e a serenidade que devem caracterizar quem opta pelo mercado acionário, porém sabendo que está colocando seu capital num setor de mais longo prazo de maturação (no mínimo, 24 meses). Não é overnight.
Adicione-se que medidas para segurança ainda maior nas ações imobiliárias serão cada vez mais incrementadas, como é o caso da padronização dos balanços das incorporadoras, já em estudo pela Comissão de Valores Imobiliários.
Bem, mas e os 100% garantidos? Isso não é comum no mundo das bolsas de valores. Perfeição não existe, mas a busca por ela, sim. E isso certamente os mercados de capitais e imobiliário estão fazendo.
João Crestana e Romeu Chap Chap são, respectivamente, presidentes do Secovi-SP e do Conselho Consultivo do Sindicato da Habitação