A necessidade de reforma tributária é um antigo consenso. Governos anteriores, desde FHC, passando por Lula e Dilma, discutiram e tentaram implementar as alterações constitucionais a fim de, potencialmente, melhorar o sistema tributário. Como sabemos, nenhum deles obteve sucesso, mesmo com o elevado apoio popular e uma sólida base parlamentar construída.
Novamente, muito se discute, em certa repetição do passado recente, sobre a unificação de tributos Federais incluído, ainda, os de competência Estadual e Municipal, a recriação da CPMF, agora alargada e renomeada para Contribuição sobre Pagamentos (CP) com uma possível contrapartida da extinção da tributação sobre a folha de salários, similar à desoneração implementada pelo governo Dilma, todas medidas de alto impacto na vida dos contribuintes que, de fato, possuem potencial para reorganizar o sistema tributário nacional, para o bem ou para o mal.
Embora tenha sido tímido em discutir e votar uma reforma constitucional ampla no passado, o Congresso foi, por outro lado, pródigo em aprovar leis ordinárias que aumentassem a carga tributária dos contribuintes. Não caberia aqui a menção a todas as citadas medidas, mas, para não deixar de exemplificar, podemos citar: a substituição do Finsocial (2%) pela COFINS (3%), a criação do PIS e da COFINS não cumulativos (a alíquotas máximas de 9,25%), e mais recentemente o aumento da tributação sobre o ganho de capital de 15% para até 22,5%, gerando um aumento na carga tributária de 20,38% do PIB, em 1988 para 32,43%, em 2017.
Se o passado nos ensina algo que nos ajuda a entender e nos preparar para o futuro, pelo menos em matéria tributária, podemos temer a repetição do mesmo enredo: discussões e debates de uma reforma constitucional ampla, com a implementação, ao final, de medidas na legislação ordinária de caráter pontual que geram aumento de carga tributária para o contribuinte. Se assim for, o contribuinte deve ficar atento às alterações que não demandam modificação constitucional, dentre elas as modificações na sistemática de tributação dos lucros e dividendos, do lucro presumido e do simples.
Temos visto uma verdadeira cruzada contra a tributação simplificada do lucro presumido e do simples. Muito se alega, e passou a ser voz corrente, que essas formas de apuração simplificada possibilitariam o planejamento fiscal abusivo, por meio de empresas prestadoras de serviços que seriam na verdade formas de encobrir uma relação empregatícia, a chamada “pejotização”, gerando uma redução fiscal dos 27,5% aplicáveis aos salários para de 11,33% a 19,53% (IR, CSL, PIS, COFINS e ISS) sobre a receita dessas pessoas jurídicas.
Tememos que essa busca em fazer justiça fiscal em relação a esses contribuintes venha a prejudicar a enorme maioria de empresas que se utilizam da tributação simplificada como forma de viabilizar seus pequenos e médios negócios. É importante, assim, entender a repercussão econômica e social de tal medida.
Nos últimos dados publicados pela Receita Federal do Brasil (RFB) verificamos que pouquíssimos (3,02%) contribuintes são responsáveis pela geração de grande parte da receita tributária (78,31%), ainda mais se considerarmos que aproximadamente 50% dessas empresas encontram-se em situação de prejuízo fiscal. As empresas optantes pela tributação pelo simples e lucro presumido têm, por sua vez, pequena participação na geração de receita fiscal (5,42% e 13,75%, respectivamente), mas representam a parcela mais relevante do número de empresas no País (91,32%).
As propostas discutidas que afetariam as formas de apuração simplificada mencionadas passam pela extinção da modalidade cumulativa (3,65%) do PIS e da COFINS, com a implementação da unificação das referidas contribuições exclusivamente na sistemática não cumulativa em uma nova exação denominada Contribuição para a Seguridade Social (CSS), com alíquotas superiores aos atuais 9,25%, o que resultaria em um aumento de, no mínimo, 5,6% sobre a receita na carga tributária final das empresas.
Da mesma forma, a proposta de tributação dos lucros distribuídos afetaria diretamente as empresas optantes, que sofreriam um aumento na sua carga tributária. Para as empresas prestadoras de serviços, dos atuais 14,53% para até 27,35%, e para as empresas comerciais e industriais, dos atuais 6,73% para até 19,77%, todos sobre a receita, se considerarmos a alíquota de 15% sobre a distribuição de lucros.
Se a proposta gera aumento da arrecadação e promove justiça fiscal sobre essa parcela de contribuintes, às pejotinhas, então ela seria benéfica, correto? Novamente, a resposta não é fácil.
Em primeiro lugar, porque o aumento de arrecadação obtido seria pouco representativo. Ou seja, esse aumento seria exigido de quase 92% das empresas, as quais representam menos de 19% de geração de receita tributária. É dizer, muito esforço para pouco resultado.
Em segundo lugar, o aumento de carga para pequenas e médias empresas – isto é, o grande público do lucro presumido e do Simples Nacional – poderia inviabilizar seus negócios, tornando-as propensas a retornar à informalidade por excesso de carga tributária. Logo, o aumento de arrecadação inicial poderia gerar efeitos negativos para a economia, inclusive com a perda de arrecadação e consequente redução do emprego formal. Resultado: o mecanismo que almeja promover justiça pode culminar em uma grande injustiça, pois, visando tributar poucos, pode prejudicar muitos, notadamente o grupo de empresas que mais gera empregos no País.
É fundamental repensar o sistema tributário brasileiro e o momento é propício para discutir as novas propostas, desde que haja o devido cuidado de não jogar o bebê fora com a água do banho.