Com patrimônio líquido de R$ 100 bilhões, não é de hoje que o FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) desperta a cobiça de setores avessos àqueles autorizados pela Lei 8.036/1990 a acessarem seus recursos. O uso do dinheiro do maior fundo privado da América Latina na promoção de políticas públicas só é permitido legalmente nas áreas de habitação, saneamento e mobilidade (infraestrutura urbana).
Tudo aquilo que se refere aos recursos financeiros do trabalhador tem de ser submetido, obrigatoriamente, à análise e à aprovação do Conselho Curador do FGTS, composto por 12 representantes da sociedade civil e por 12 membros do governo federal. São eles que definem o tamanho do orçamento anual a ser aplicado nas áreas legalmente estabelecidas, obedecendo à distribuição de 60% em habitação, e à divisão equitativa dos 40% restantes entre saneamento e infraestrutura.
Abelardo Campoy Diaz, conselheiro do FGTS pela CNC (Confederação Nacional do Comércio), conta que a liberação de volumosos orçamentos para esses segmentos só foi possível em virtude da boa gestão dos recursos. Contudo, a arrecadação negativa dos últimos três anos, por causa do desemprego, fez com que o Fundo perdesse muito de sua capacidade financeira. De acordo com a PNAD Contínua (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua), do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), em fevereiro de 2014, eram 6,623 milhões de desempregados, número que dobrou em fevereiro de 2017, chegando a 13,457 milhões.
Apesar disso, o orçamento aprovado pelo Conselho Curador do FGTS para 2018 é de R$ 85,5 bilhões (R$ 69,5 bilhões para habitação e R$ 6,8 bilhões para saneamento básico e mobilidade), com previsão de investimentos de R$ 81,5 bilhões anuais até 2021. E a cifra só não será maior, principalmente para o ano que vem, porque a União autorizou o saque de boa parte das contas inativas em 2017 como medida emergencial para aquecer a economia, resultando em aproximadamente R$ 50 bilhões a menos nos cofres do Fundo.
Socorro necessário – A liberação dos recursos das contas inativas do FGTS – que, sempre vale a pena lembrar, é um fundo privado com gestão pública da Caixa Econômica Federal desde a extinção do BNH (Banco Nacional de Habitação), em 1986 – não chegou a abalar a sua liquidez, mas levou o CCFGTS a fechar as torneiras do orçamento.
Permitir a migração do dinheiro do Fundo para a economia foi uma decisão positiva e acertada, conforme análise do economista e professor da Saint Paul Escola de Negócios, Maurício Godoi. Ele explica que, além de barato, o recurso estava parado em um momento que o governo precisava socorrer a macroeconomia e superar a ineficácia de medidas emergenciais de estímulo ao crescimento adotadas anteriormente. “Foi uma espécie de emissão de papel moeda.”
Apesar de significar menos dinheiro para habitação, saneamento e infraestrutura urbana, esse socorro esporádico e pontual foi absolutamente necessário para a retomada das expectativas de consumo, para a diminuição do endividamento das famílias e até mesmo para estimular os investimentos de recursos em outros mercados financeiros.
Boa parte do dinheiro sacado foi para o comércio e o efeito da medida de amparo à liquidez econômica pode ser percebido no resultado do PIB (Produto Interno Bruto) do segundo semestre de 2017, sem que tenha acarretado qualquer tipo de impacto negativo à saúde do FGTS, de acordo com explicação de Godoi.
Indiretamente, o mercado imobiliário se beneficiou e os efeitos positivos começam a aparecer agora. “Ainda que mínimos, os indicadores devem ser comemorados, porque pararam de cair e iniciaram a inversão da curva, que só vai subir daqui para frente”, aposta o professor da Saint Paul Escola de Negócios, referindo-se à ligeira elevação no volume de lançamentos e de vendas de unidades residenciais novas na cidade de São Paulo no mês de outubro.
Para ele, os saques das contas inativas foram um capítulo à parte na história da redução do volume de recursos do FGTS. O maior golpe veio mesmo do desemprego dos últimos três anos.
Nem tão impopular – Considerando que a medida liberou em poucos meses quase o orçamento de um ano do FGTS para habitação, era de se esperar uma enxurrada de críticas do setor. No entanto, a reação foi outra. “A medida foi legítima. O único problema é que abriu um precedente perigoso. Agora, outros setores endividados, com alta inadimplência, tentam usar o dinheiro do trabalhador para sanar suas dívidas atacando o Fundo”, opina Emilio Kallas, vice-presidente de Incorporação e Terrenos Urbanos do Secovi-SP. O dirigente faz alusão à tentativa..
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