Carrapato presente nas capivaras é transmissor da doença 

Uma doença rara, mas com alto índice de letalidade, vem preocupando moradores e administradores de condomínios e loteamentos, principalmente no interior do Estado de São Paulo: a febre maculosa brasileira (FMB). Na última década, foram registrados 636 casos no Estado, levando mais da metade à morte (341 pessoas). Os dados são da Divisão de Zoonoses do Centro de Vigilância Epidemiológica da Secretaria da Saúde do Estado de São Paulo (CVE/SES-SP). O estudo aponta a ocorrência de 717 casos em todo o Brasil.

A bactéria causadora da FMB é a Rickettsia rickettsii, que pode infectar carrapatos – os mais comuns são Amblyomma sculptum (carrapato-estrela) e Amblyomma aureolatum (carrapato-dourado) – encontrados em vários animais, como cavalos, cães e, principalmente, nas capivaras, bastante comuns em condomínios e loteamentos próximos a áreas de preservação, com riachos e lagoas, no interior do Estado.

Segundo Cristina Sabbo, pesquisadora do Departamento de Assistência Técnica aos Municípios da Superintendência de Controle de Endemias (Sucen), os meses de outubro a dezembro são os mais críticos para a proliferação da doença. “É a época em que se observa maior densidade de ninfas (estágio anterior à fase adulta) de carrapatos. A elevação da temperatura ajuda no ciclo de vida do inseto, que é longo, durando até um ano”, explica. “Os carrapatos se encontram dentro da mata, pois gostam de áreas gramadas e sombreadas. Áreas ensolaradas não são propícias para ele.”

Para que haja transmissão da doença, o carrapato infectado precisa ficar de 4 a 6 horas grudado na pele das pessoas. Por isso, ao perceber sinais de picada, a pessoa deve rapidamente tirar o carrapato do corpo, ferver a roupa usada e observar o aparecimento de sinais da doença.

Diagnóstico difícil – Os primeiros sintomas aparecem de 2 a 14 dias após a picada, sendo a maioria dos casos em 7 dias. A pessoa infectada vai apresentar, de forma abrupta, sintomas como febre alta, cefaleia, mal-estar generalizado, diarreia, náusea e dor abdominal, muito semelhantes aos de outras infecções, por isso a dificuldade de diagnóstico. Também nota-se o aparecimento de pontos vermelhos na palma das mãos e na planta dos pés. Ao entrar na circulação sanguínea do infectado, a bactéria causa vasculite, lesão da camada interna dos vasos.

“Suspeitou que pode ser febre maculosa, a pessoa deve imediatamente procurar atendimento médico, informar os sintomas, se sofreu picada de carrapato ou se expôs a animais domésticos ou silvestres que estiveram em mata, rio ou cachoeira, e iniciar o tratamento imediatamente”, orienta Cristina.

A doença tem cura, contanto que o tratamento seja iniciado em até cindo dias. A demora no diagnóstico e no início do tratamento podem trazer complicações graves, afetando o sistema nervoso central, rins e pulmões, ou, até mesmo, levar o paciente à morte.

O tratamento é feito por meio da administração do antibiótico doxiciclina, via endovenosa, de 7 a 10 dias. O paciente também deve fazer o exame para confirmar o diagnóstico da FMB, mas não se deve esperar pelo resultado, que leva de 15 a 30 dias, para iniciar o tratamento. A doença não é contagiosa (não é transmissível de uma pessoa para outra) e ainda não há vacina.

Alerta para condomínios e loteamentos – No interior do Estado, é comum empreendimentos imobiliários construídos perto de mata ciliar e de coleções hídricas (beirada de rios, riachos e lagos) atraírem a capivara, que se aproxima do homem atrás de comida, água e abrigo. “Elas são dóceis e, nesses locais, não há presença do predador natural, que é a onça pintada. O desequilíbrio e a degradação ambiental favorecem a transmissão de doenças, inclusive a febre maculosa”, explica Cristina Sabbo.

Ela comenta que há um termo de cooperação técnica entre a Sucen e a Secretaria de Estado do Meio Ambiente para atuação conjunta em áreas com capivaras. Sempre que houver caso de febre maculosa associado à presença de capivara, as duas entidades atuam em parceria. “Nunca isoladamente, porque a capivara é animal silvestre protegido por leis ambientais”, justifica.

O empreendimento que passar por essa situação deve solicitar o manejo de animais silvestres, via requerimento, no site da Secretaria do Meio Ambiente, que agendará a visita de um técnico responsável para fazer a avaliação. “Ele abrirá um processo para levantar informações como quantidade de capivaras, presença do carrapato, presença de humanos, frequência de pessoas com suspeita etc., e fornecerá orientações”, explica a pesquisadora da Sucen.

Exemplo – O loteamento Capitalville 1, localizado na cidade de Cajamar, sofre com a presença de capivaras há quase dez anos. Inaugurado há 35 anos, o empreendimento totaliza 550 lotes, 1.500 moradores e 500 prestadores de serviços, além de extensa área verde e diversos lagos. Segundo Maria Isabel Hidalgo, presidente da Associação de Proprietários de Lotes, há oito anos, as capivaras começaram a se avolumar, chegando a 200.

“Surgiu a preocupação com a febre maculosa, o que nos fez buscar informações e orientações com prefeitura, órgãos ambientais e zoonose. Há dois anos, contratamos dois veterinários especialistas em carrapatos e em capivaras”, relata a presidente. Uma das profissionais contratadas acompanha o caso até hoje. A veterinária conduziu todo o processo, fez o levantamento de quantidade de capivaras, se tinham ou não a bactéria e a presença de carrapato. Nessa época, havia 80 capivaras. Colheram amostra de 20 animais e 70% tinham a bactéria.

A associação formalizou um processo para manejo de capivaras em 2016 junto aos órgãos públicos e montou um projeto completo, em andamento, para erradicar o problema. As capivaras que passarem pela triagem ficarão em área isolada do loteamento, com alambrado de 1,80 metro e monitoradas até o fim da vida, cuja expectativa gira em torno de 10 a 12 anos. 

Todo o processo consiste em um impacto financeiro e a questão foi levada para a assembleia, que aprovou arrecadação mensal extraordinária específica para o projeto.  “Até maio de 2018, terá arrecadação para o projeto em andamento. É um custo elevado e optou-se pela cobrança extraordinária porque é algo pontual, apartado do dia a dia”, explica Maria Isabel. Depois de concluído o projeto, o contrato com a veterinária será mantido para cuidados e alimentação das capivaras. “Quando há uma situação como essa, o gestor do empreendimento precisa saber lidar com as divergências de opiniões entre os associados e buscar informações oficiais sobre como tratar as capivaras”, orienta Cristina Carner Pilot, gestora do Capitalville 1.

Mariângela Iamondi Machado, diretora de Associações em Loteamentos e Bairros Planejados da vice-presidência de Administração Imobiliária e Condomínios do Secovi-SP, enfatiza a importância do monitoramento de situações semelhantes. “É um trabalho sério, de cuidado e de investimento na vida humana. Ninguém dá valor até a primeira morte”, alerta. “O tema deve ser levado aos associados e condôminos. Vale investir em um trabalho preventivo, que é tão importante quanto o item segurança.”

Mapa da febre maculosa brasileira – São Paulo é disparado o Estado com o maior número de casos, segundo o levantamento do CVE/SES-SP, seguido do Rio de janeiro (5 casos), Mato Grosso do Sul (2) e Minas Gerais (2). As cidades do interior paulista concentram o maior índice de ocorrências, principalmente Campinas (63), Piracicaba (54) e Valinhos (45). No ABC, Santo André e São Bernardo, cidades com resquícios de mata atlântica – propícia à proliferação do carrapato –, somam 55 casos.

De acordo com Cristina Sabbo, da Sucen, o número elevado pode ser atribuído, em parte, à melhora da vigilância no sistema de informação do CVE do Estado de São Paulo e na notificação dos casos, consequência da intensificação da capacitação contínua, ao longo dos últimos dez anos, de técnicos, auxiliares de enfermagem, médicos e agentes, profissionais que recebe as pessoas doentes. Segundo a pesquisadora, os centros de vigilância não seguem um mesmo padrão.

Os casos de febre maculosa devem ser notificados obrigatoriamente em até 24 horas às autoridades sanitárias competentes por meio de canais como o Disque-Notifica: 0800-644-6645, o e-mail notifica@saude.gov.br e o site da Secretaria de Vigilância em Saúde  www.saude.gov.br/svs. As notificações imediatas visam à prevenção de novos casos e até mesmo de um surto.

CUIDADOS

– Viagens ou passeios onde há carrapatos

– Evite pele exposta

– Use calças e blusas com mangas compridas longas

– Use roupas de cor clara para visualizar os carrapatos

– Coloque a meia por cima da calça

– Use botas longas também

– Examine-se a cada 3 horas e retire possíveis carrapatos

– Se houver carrapatos grudados nas roupas, retire-as e ferva

– Se remover o carrapato da pele, lave a região com água e sabão

Loteamentos e condomínios

– Cerque/demarque a área com alambrado ou muro~, evitando a invasão da capivara

– Cerque playgrounds

– Utilize pedriscos em áreas de caminhada

– Mantenha gramado baixo

– Conscientize e oriente moradores e profissionais que trabalham no local a não entrar em áreas de mata, principalmente com animal de estimação, e ficar atento a picadas de carrapato.

É permitida a reprodução, desde que citada a fonte

Capivaras e carrapatos são vetores da febre maculosa

Uma doença rara, mas com alto índice de letalidade, vem preocupando moradores e administradores de condomínios e loteamentos, principalmente no interior do Estado de São Paulo: a febre maculosa brasileira (FMB). Na última década, foram registrados 636 casos no Estado, levando mais da metade à morte (341 pessoas). Os dados são da Divisão de Zoonoses do Centro de Vigilância Epidemiológica da Secretaria da Saúde do Estado de São Paulo (CVE/SES-SP). O estudo aponta a ocorrência de 717 casos em todo o Brasil.

A bactéria causadora da FMB é a Rickettsia rickettsii, que pode infectar carrapatos – os mais comuns são Amblyomma sculptum (carrapato-estrela) e Amblyomma aureolatum (carrapato-dourado) – encontrados em vários animais, como bois, cavalos, cães e, principalmente, nas capivaras, bastante comuns em condomínios e loteamentos próximos a áreas de preservação, com riachos e lagoas, no interior do Estado.


É comum empreendimentos imobiliários construídos próximos de mata ciliar e de lagos atraírem capivaras


Segundo Cristina Sabbo, pesquisadora do Departamento de Assistência Técnica aos Municípios da Superintendência de Controle de Endemias (Sucen), os meses de outubro a dezembro são os mais críticos para a proliferação da doença. “É a época em que se observa maior densidade de ninfas (estágio anterior à fase adulta) de carrapatos. A elevação da temperatura ajuda no ciclo de vida do inseto, que é longo, durando até um ano”, explica. “Os carrapatos se encontram dentro da mata, pois gostam de áreas gramadas e sombreadas. Áreas ensolaradas não são propícias para ele.”

Para que haja transmissão da doença, o carrapato infectado precisa ficar de 4 a 6 horas grudado na pele das pessoas. Por isso, ao perceber sinais de picada, a pessoa deve rapidamente tirar o carrapato do corpo, ferver a roupa usada e observar o aparecimento de sinais da doença.

Diagnóstico difícil – Os primeiros sintomas aparecem de 2 a 14 dias após a picada, sendo a maioria dos casos em 7 dias. A pessoa infectada vai apresentar, de forma abrupta, sintomas como febre alta, cefaleia, mal-estar generalizado, diarreia, náusea e dor abdominal, muito semelhantes aos de outras infecções, por isso a dificuldade de diagnóstico. Também nota-se o aparecimento de pontos vermelhos na palma das mãos e na … (leia mais).

Reportagem de Catarina Anderáos para a Revista Secovi-SP – A revista do Mercado Imobiliário 286, outubro/2017, pp. 46 a 51.

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