Confira artigo do presidente do Secovi-SP, Rodrigo Luna, publicado no jornal O Estado de S.Paulo

O município de São Paulo tem poucos ícones arquitetônicos. Durante anos, o Edifício Altino Arantes (conhecido por Banespão), a Catedral da Sé, o Masp e o Monumento das Bandeiras eram os principais símbolos da cidade. Até que outro despontou na paisagem urbana: a Ponte Octávio Frias de Oliveira.

Inaugurada em 10 de maio de 2008, essa ponte estaiada é hoje um dos mais famosos cartões postais de São Paulo. Mas o que poucos sabem é que os recursos que permitiram sua execução vieram do mercado imobiliário, que financiou a integralidade da obra por meio da Operação Urbana Consorciada Água Espraiada, adquirindo Certificados de Potencial Adicional de Construção (Cepacs), títul

Rodrigo Luna – presidente do Secovi-SP

os mobiliários emitidos pela Prefeitura e aprovados pela Câmara de Valores Mobiliários (CVM).

Ocorre que a ponte é apenas um dos exemplos dos benefícios sociais dessa Operação Urbana. Na verdade, eles vão muito além. Com esses recursos também foram produzidas centenas de Habitações de Interesse Social (HIS) dirigidas à baixa renda. Este é o caso do Conjunto Habitacional Jardim Edite, na região sul da Capital (Brooklin), que ofereceu moradia digna a 320 famílias que viviam em favela existente na região, isso sem contar outras 1.500 famílias que também já foram beneficiadas e mais 7.500 que ainda o serão.

Também foram realizadas importantes obras de saneamento básico (Bacia do Cordeiro) e drenagem (Córrego Pinheirinho), 3.300 km de corredores de ônibus e diversas outras benfeitorias já implantadas ou projetadas, como o Parque do Chuvisco e a Ponte Laguna.

A Operação Urbana Faria Lima, por sua vez, pôs em marcha um programa que melhorou a acessibilidade de ciclistas e de pedestres, reorganizou fluxos de tráfego, priorizou o transporte coletivo, a qualificação ambiental de espaços públicos (reconversão do Largo da Batata) e propiciou em seu perímetro ou entorno imediato a produção de 2.120 HIS.

Além das Operações Urbanas, a cidade tem na outorga onerosa do direito de construir outra importante fonte de recursos que são empregados para melhorar a vida dos cidadãos. Também conhecida como “solo criado”, ela é a concessão emitida pelo município para que o proprietário de um imóvel edifique até o limite estabelecido na legislação para o coeficiente de aproveitamento máximo, mediante contrapartida financeira a ser paga pelo empreendedor ou pelo proprietário do imóvel.

Os recursos das outorgas onerosas são direcionados para o Fundo de Desenvolvimento Urbano (Fundurb) e destinados ao financiamento do desenvolvimento urbano do município de São Paulo em ações como: aquisição de terrenos ociosos e produção de HIS, melhorias de bairros, requalificação de paradas de ônibus, implantação de ciclovias e parques, obras de infraestrutura urbana e manutenção de equipamentos culturais, enfim, intervenções que contribuem para a cidade e seus habitantes.

Sem segurança, este moderno instrumento de melhoria urbana pode deixar de servir aos interesses sociais coletivos

Por meio do Fundurb, organismo composto por representantes do poder público e da sociedade civil, entre 2004 e 2022, em valores atualizados, foram arrecadados cerca de R$ 400 milhões por ano, em média. No mesmo período, as Operações Urbanas Água Espraiada e Faria Lima proporcionaram à coletividade mais de R$ 10 bilhões, o equivalente a quase 11% do Orçamento municipal de 2023, estimado em R$ 95,8 bilhões.

Se, por um lado, a outorga onerosa pode ter um papel importante no processo de desenvolvimento da cidade, as Operações Urbanas, com enorme potencial de viabilizar intervenções urbanísticas, podem deixar de servir aos interesses sociais coletivos. Motivo: insegurança jurídica. Afora o valor dos Cepacs ser muitas vezes arbitrado de forma incompatível com o bolso do comprador final, a judicialização é fator impeditivo.

Em 2021, a Prefeitura foi impedida de executar, em parceria com o setor privado, as Operações Urbanas Água Branca e Bairros do Tamanduateí, além dos Projetos de Intervenção Urbana (PIUs) Arco Jurubatuba, Arco Pinheiros, Vila Leopoldina-Villa Lobos e Setor Central. Conforme estudos, num prazo de 20 anos para sua efetivação, apenas esses seis instrumentos urbanísticos proporcionariam um efeito total na economia de R$ 521 bilhões.

A defesa da segurança jurídica deste moderno instrumento de melhoria urbana e a consequente oferta de HIS é tarefa que cabe à sociedade paulistana. É exemplo de parceria público-privada que funciona como indutor da produção de lares, requalificação urbana, infraestrutura básica e desenvolvimento econômico e social. Enfim, representa um mecanismo de produção de bem-estar e de urbanismo saudável que a cidade não pode perder.

O poder público não tem recursos próprios para combater um déficit habitacional de quase 370 mil unidades e tampouco atender ao crescimento anual da demanda por novas habitações. Há mais de 30 mil pessoas em situação de rua para abrigar. Esse triste cenário não se irá resolver com a produção de 24 mil unidades/ano. É por meio de parcerias, calcadas em instrumentos seguros do ponto de vista jurídico, que teremos condições de responder às legítimas demandas sociais.

Autor: O Estado de S. Paulo, Coluna Espaço Aberto – Edição de 21/2/2023 (p. A4)