Evento em Brasília foi promovido pela CBIC

Caio Portugal, vice-presidente de Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente do Secovi-SP, participou do seminário “O Iphan no licenciamento ambiental: diálogos e perspectivas jurídicas”, organizado pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) e pela CBIC (Câmara Brasileira da Indústria da Construção) nos dias 22 e 23 de outubro, e saiu de lá com a sensação de o setor ter dado mais um passo no sentido de eliminar distorções no licenciamento ambiental de projetos imobiliários. O evento reuniu mais de 200 profissionais das áreas de engenharia, arqueologia, direito, biologia, gestão pública e mineração.

O dirigente, que também é presidente da Aelo (Associação das Empresas de Loteamento e Desenvolvimento Urbano), palestrou no segundo dia de debates, quando as discussões convergiram para a necessidade de se aperfeiçoar as normas e aumentar a transparência dos processos de licenciamento de obras.

Correções – Há mais de dois anos, Caio Portugal alerta os empresários de desenvolvimento urbano quanto aos entraves da Instrução Normativa 01, de 2015, do Iphan, em razão de alguns excessos, como a necessidade de laudo de análise de arqueólogo para o licenciamento de projetos.

Ele explicou que, antes da IN 001/2015, os loteadores, em especial os de menor porte, se preocupavam em desenvolver estudos arqueológicos preventivos em casos bastante específicos (EIA-Rima e RAP – Relatório Ambiental Preliminar), e a linha de corte era para empreendimentos com área superior a um milhão de metros quadrados (100 hectares) ou, então, quando a Cetesb (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo) estabelecia a necessidade de emissão de relatórios ambientais preliminares para áreas de 70ha e 25ha separadas de áreas urbanas ou no litoral do Estado de São Paulo, respectivamente, em razão da complexidade ambiental local.

Portugal: Unir experiências

Caio Portugal deixou clara a preocupação dos empreendedores com a correta aplicação da IN 001/2015. “Cada vez mais, entendemos a nossa participação na construção do espaço urbano de forma convergente com as necessidades do poder público. Trabalhamos para as ocupações urbanas serem melhores, com ampla precaução e preservação ambiental, e boa aplicação dos recursos, tanto os públicos quanto os privados. Com projetos mais bem elaborados, evitam-se as idas e vindas das análises, o retrabalho, o desperdício de tempo e de recurso.”

Identificar gargalos – Pesquisa da CBIC (Câmara Brasileira da Indústria da Construção) realizada junto aos seus associados e no âmbito da CII (Comissão da Indústria Imobiliária) apresenta dados preocupantes, como a diminuição da oferta das unidades habitacionais novas frente ao aumento constante da necessidade de moradia no País por mais e mais famílias. “Muito desse comportamento de mercado decorreu das dificuldades macroeconômicas do País, mas também das questões dos custos cada vez mais atrelados à produção imobiliária. Daí a necessidade de ampliar o diálogo e melhorar a eficiência daquilo que impacta o custo da produção imobiliária”, explicou Caio Portugal.

Para ele, o primeiro passo no sentido de aprimorar a IN 001/2015 é identificar os principais problemas de aplicação por parte dos empreendedores, seja na contratação de arqueólogos, no estabelecimento de critérios objetivos para se definir os parâmetros corretos de exigências desses técnicos, ou na análise e avaliação desses processos pelos técnicos do Iphan. “Isso é importante para entender as ineficiências e inconformidades dos profissionais contratados pelo setor privado e que impactam no trabalho do Iphan. A partir daí, será possível criar soluções em parceria com o órgão público.”

Dentre as principais críticas à IN 001, o vice-presidente do Secovi-SP destacou os prazos, custos, falta de critérios na apresentação de projetos e na aprovação. “Não há definição dos parâmetros mínimos de pesquisa arqueológica.” Ele explicou que muitos empreendedores pediram alteração do Nível II para o Nível III no processo de Licença Prévia (LP) para a instalação de loteamento, para que, durante a fase preliminar em que não há supressão de vegetação para efeito de investigação, o arqueólogo possa fazer essa investigação inicial paralelamente à aprovação do projeto, para que, no momento em que o empreendedor receber o alvará de execução das obras e a licença ambiental, ele saiba quais as áreas de sítio arqueológico devem ser protegidas.

Capacitação – Infelizmente, é baixa a quantidade de profissionais de arqueologia habilitados para desenvolver análises prévias e acompanhar simultaneamente vários empreendimentos imobiliários, e a IN 001/2015 tem a capacidade de habilitar de 200 a 400 processos de loteamentos por ano, somente no Estado de São Paulo, para seguirem para o departamento de investigação arqueológica do Iphan.

Katia: Projetos mais bem direcionados metodologicamente

De acordo com Caio Portugal, a falta de critérios básicos de investigação aumenta os custos desse trabalho. Empreendedores de loteamentos que buscam arqueólogos para realizarem investigações técnicas de sítios arqueológicos se depararam com propostas que variam de R$ 50 mil a R$ 200 mil. “Existe a necessidade de se criar um parâmetro mínimo, que auxilie o loteador a contratar a atividade do arqueólogo”, sugeriu.

Outro aspecto que limita a atividade dos loteadores é a falta de mapeamento das áreas de proteção arqueológica nas regiões urbanas. No sentido de desburocratizar o procedimento, o setor propõe a revisão dos níveis de investigação, a fim de se aceitar a autodeclaração do empreendedor. Essa permissão ficaria restrita às áreas consideradas de menor importância, cabendo aos técnicos do Iphan o controle e a investigação acerca da veracidade das informações.

Medidas imediatas podem ser tomadas para aprimorar a IN 001, como caracterizar o que são sítios arqueológicos, mapear e georreferenciar essas áreas, identificando as que devem e as que não devem ser investigadas. “É possível facilitar o critério objetivo de orientação das investigações científicas e técnicas, se criarmos uma proposta a quatro mãos, unindo as experiências do setor privado com as do setor público”, defendeu Caio Portugal.

Alinhamento – Na avaliação de Kátia Bogea, presidente do Iphan e representante do Ministério da Cultura no seminário, o evento proporcionou a todos a oportunidade de ampliar as discussões sobre procedimentos de proteção, gestão e difusão do patrimônio arqueológico brasileiro no universo do licenciamento ambiental. Além do avanço intelectual, o seminário permitiu aos técnicos em arqueologia do Iphan o entendimento das situações que devem ser aprimoradas, a fim de deixar o processo de licenciamento mais assertivo e ágil. “Houve o alinhamento de alguns direcionamentos e interpretações da legislação fundamentais à uniformização das manifestações do Iphan no tocante à gestão do patrimônio arqueológico no âmbito do licenciamento”, disse Kátia.

O Iphan se comprometeu a realizar uma consulta pública para aprimorar a FCA (Ficha de Caracterização de Atividade), que é o documento responsável pelo início do processo de licenciamento junto ao Instituto.

Para responder as demandas dos setores de loteamentos, mineração, geração e transmissão de energia, o Iphan vai ampliar os estudos no sentido de revisar o Anexo 2 da IN 01/2015, a fim de licenciar os tipos e a magnitude de empreendimentos que efetivamente podem impactar o patrimônio arqueológico e elaborar documentos esclarecedores para uniformizar as manifestações do Instituto de proteção do patrimônio histórico em todo o Brasil e, assim, diminuir as solicitações de complementação das informações necessárias à análise dos projetos.

De acordo com Kátia, em 2015, houve um grande avanço no processo de licenciamento ambiental no País a partir de uma série de normativas que passaram a vigorar, como a Portaria Interministerial n° 60/2015 e a IN 01/2015, do Iphan. “A Instrução ajustou a nossa atuação aos principais modelos de avaliação de impacto ambiental e de patrimônio cultural adotados no Brasil e nos países mais avançados neste tema, que usam a tipologia dos empreendimentos como critérios de análise”, disse.

Um aspecto da IN destacado pela presidente do Iphan foi a sua capacidade de estabelecer o “diálogo institucional” entre o Instituto, o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), e demais órgãos de meio ambiente que usam há décadas o “modelo por tipologias” para balizar as requisições de estudos. Também foi possível, de acordo com ela, ajustar os prazos aos procedimentos do licenciamento ambiental. “Conferimos maior previsibilidade para a atuação do Iphan, mas, sobretudo, maior segurança jurídica ao empreendedor que, ao cumprir os procedimentos estabelecidos na IN e seguir o Termo de Referência emitido para seu empreendimento, dificilmente poderá ser questionado pelos órgãos de controle.”

Marcelo Coluccini, advogado com especialização em Engenharia Ambiental e diretor regional do Secovi-SP em Campinas, tratou, em sua palestra, dos impactos dos estudos arqueológicos na aprovação de empreendimentos imobiliários. Ele lembrou que a IN 01/2015 prevê a manifestação do Iphan nos processos de licenciamento ambiental quando houver intervenção na AID (Área de Influência Direta) do empreendimento sobre os bens culturais acautelados em âmbito federal.

Assim como Caio Portugal, o diretor do Sindicato da Habitação em Campinas defendeu a proposta de tornar autodeclaratório o processo imobiliário junto ao Iphan. “O empreendedor faz a declaração e se responsabiliza a parar as obras e comunicar o Instituto, caso faça alguma descoberta arqueológica na área do empreendimento. Em caso de má-fé do empreendedor, ele fica sujeito às penalidades legais.” A proposta foi apoiada.

Aprimoramento – Conforme informações de Kátia, o Iphan vai adotar medidas destinadas a aprimorar a conduta do órgão com respeito aos prazos, a partir da criação de um formulário eletrônico de requerimento e análise simplificado, a ser emitido por quem protocolar solicitação, entregar projeto ou relatório junto ao Iphan. Esse documento também deverá ser preenchido pelo técnico após conclusão das análises.

O formulário será uma espécie de check-list. “Se o arqueólogo não puder responder, em poucas linhas, todos os itens solicitados no documento, é possível que o Iphan solicite complementação. A proposta não é gerar mais burocracia, mas usar um mecanismo simples e ágil de indicadores que permitam monitorar todo o processo de análise de projetos”, esclareceu a presidente do Instituto.

Outra medida em andamento é a uniformização de posicionamentos, solicitações e manifestações para que, a partir da elaboração de documentos (portarias, ofícios e memorandos), o Iphan torne claro ao corpo técnico e aos empreendedores como a IN deve ser interpretada nos casos que, estatisticamente, o Iphan tem verificado maior número de complementação de informações aos arqueólogos e aos empreendedores.

O Iphan pretende criar parâmetros referenciais de metodologia para, aos poucos e com base na demanda dos setores, estabelecer referências metodológicas norteadoras para desenvolver projetos de pesquisa de licenciamento. “Essa parametrização, além de permitir a elaboração de Termos de Referência mais assertivos, possibilitará que os empreendedores saibam quais as atividades e ações devem demandar a contratação de consultorias e arqueólogos”, esclareceu a presidente Kátia. Ela acredita que, diante de projetos mais bem direcionados metodologicamente, os técnicos do Iphan poderão se manifestar mais rapidamente.

Capacidade de diálogo – Tanto os representantes do poder público quanto da iniciativa privada ressaltaram a importância de os setores manterem um diálogo constante. Na opinião da presidente do Iphan, as dificuldades enfrentadas pelos empresários devem ser avaliadas, da mesma forma que o setor tem de compreender a participação do Instituto no processo.

“Sempre é possível extrair um aprimoramento destas discussões, seja em matéria de procedimentos ou de compreender melhor a importância do patrimônio cultural para a sociedade, inclusive em termos financeiros”, opinou.

A interação dos setores, com base em diálogos transparentes, leva ao aprimoramento de todo o processo e amplia a compreensão de cada uma das partes acerca da necessidade ou não de se realizar pesquisas arqueológicas.

Exemplo dessa aproximação por meio do diálogo foi destacado pela presidente do Iphan e se refere à área de loteamentos. Em um estudo ainda preliminar, o Instituto identificou que, tanto a estratégia de acompanhamento (Nível II) como a de prospecção interventiva no solo (Nível III), identificam sítios arqueológicos na mesma proporção. Dessa forma, os representantes do setor foram consultados para apontarem a estratégia mais conveniente a eles, em razão de prazos, obtenção de LP (Licença Prévia) e custos.

Além de permitir ao desenvolvedor imobiliário realizar a escolha prévia da classificação do empreendimento, a mudança diminui o tempo de análise de projeto, por liberar o Iphan da necessidade de analisar as justificativas das solicitações de mudança de nível, e de elaborar um segundo termo de referência.

Reportagem de Shirley Valentin para a Revista Secovi-SP – A revista do Mercado Imobiliário 299, Dezembro/2018 e Janeiro/2019, pp. 28 a 32.

A reprodução é permitida, desde que citada a fonte.