A cidade de São Paulo, segundo pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), concentra 25% dos moradores de rua de todo o Brasil, chegando à marca histórica de 48.261 pessoas vivendo nessa situação em 2022. A solução para o grave problema dos moradores de rua, todos sabemos, é complexa, difícil de ser alcançada e envolve uma abordagem multisetorial.

Dentre os vários aspectos que devem ser tratados, destacam-se habitação, acesso orientado à saúde, oportunidades de emprego, oferta de alternativas para educação (em especial para crianças e jovens), programas para redução do envolvimento com a criminalidade, e sistemas eficientes e responsivos, que possam evitar o agravamento da situação.

A solução para moradores de rua vem sendo abordada em muitos países, inclusive na cidade de São Paulo, por meio do conceito denominado “housing first”, ou habitação em primeiro lugar. A habitação estrutura a base a partir da qual uma pessoa ou uma família podem acessar os serviços e apoios necessários para alcançar a reintegração social, iniciar o processo de recuperação e buscar objetivos pessoais.

Seguramente, não existe um modelo único para projetos de habitação objetivando moradores de rua. De qualquer maneira, o fornecimento da habitação pode envolver reforma ou construção de novas moradias, subsídios cruzados, com esse fim específico, na produção de empreendimentos privados, ou o aluguel pelo Estado de apartamentos individuais, estrategicamente localizados em determinadas áreas.

Em qualquer dessas hipóteses, deve haver, durante períodos específicos, assistência e acompanhamento pelos órgãos públicos, da etapa que envolve a saída das ruas e o ingresso numa moradia, até que esse processo esteja estabilizado.
As pessoas que vivem em situação de rua geralmente têm sérios distúrbios relacionadas à saúde, incluindo problemas mentais e transtornos por uso de drogas, condições médicas crônicas como diabetes e hipertensão, além de doenças infecciosas como HIV/AIDS, hepatite C e tuberculose.

Os cuidados com a saúde serão mais eficazes quando integrados com a assistência à moradia, que serve como uma plataforma para a prestação consistente de cuidados e serviços de saúde aos moradores. Importante, portanto, desenvolver novos modelos de atendimento e prestação de serviços de saúde nas casas de pessoas que passaram pela situação de viver nas ruas, integrando os serviços de saúde com os serviços sociais.

É fundamental ainda garantir que essas pessoas tenham acesso a alternativas para o tratamento de transtornos por uso drogas e a visitas domiciliares por profissionais da saúde, para mães, bebês e crianças na fase da primeira infância.

Com a moradia solucionada, e a saúde sob controle, a próxima etapa é o trabalho. Uma das maneiras mais eficazes de apoiar as pessoas que saem da condição de sem-teto e vão para uma moradia permanente é aumentar o acesso a oportunidades de emprego e treinamento profissional adequado.

Cada uma das cidades que enfrentam problemas com moradores de rua tem características próprias, e devem desenvolver, em função dessas características, as melhores práticas para ajudar as pessoas nessa situação a superarem as barreiras ao emprego. Essas estratégias, que objetivam aumentar as oportunidades de trabalho, devem abordar perspectivas que levem em consideração aspectos que podem se constituir em óbices à reintegração dessas pessoas na sociedade.

Dentre esses aspectos, é possível destacar mobilidade urbana, necessidade de creches, pensão alimentícia, violência doméstica, histórico de envolvimento criminal, condições incapacitantes, experiência de trabalho limitada e adequação da idade.

Finalmente, é preciso reconhecer que uma solução definitiva para os moradores de rua envolve esforços das esferas federal, estadual e municipal, e sem uma robusta e eficiente parceria na busca por esse objetivo, será impossível estruturar um modelo capaz de prevenir e eliminar esse degradante e inaceitável cenário, presente em muitas de nossas cidades.

Claudio Bernardes é vice-presidente do Secovi-SP.

* Artigo publicado no jornal Folha de S.Paulo: dias 28/7 (on-line) e 29/7 (impresso).