Esclarecimentos sobre o segmento de loteamentos

Na manhã desta quinta-feira, 2/4, um grupo de especialistas da área de loteamentos apresentou, durante uma live que teve o acompanhamento de mais de 300 pessoas, os impactos da pandemia de coronavírus (COVID-19) neste segmento imobiliário.

Presidente da Aelo e vice-presidente de Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente do Secovi-SP, Caio Portugal destacou que o momento atual é de união, perseverança, e foco para impedir que o poder público interfira nas relações privadas. “As empresas devem dialogar com todos aqueles que fazem parte da sua cadeia de produção, principalmente os clientes, para que seja preservada a relação contratual”, destacou.

Portugal lembrou que as prefeituras estão adotando medidas de contenção da pandemia conforme as especificidades regionais, e que a maioria não tem atendimento presencial, somente para recebimento de projetos nos guichês.

No Estado de São Paulo, o Graprohab tem mantido os prazos regimentais existentes e só atende mediante agendamento. Contudo, estão abertos os canais de comunicação no site da Secretaria Estadual de Habitação e no Twitter. Portugal explicou que as reuniões estão acontecendo normalmente, porém, por meio eletrônico. Os prazos dos projetos continuam valendo, com previsão de prorrogação junto a algumas secretarias, a fim de cumprirem o atendimento de exigências.

Quanto aos cartórios de registro de imóveis e tabelionatos, Portugal citou os Provimentos de nº 94 (CNJ) e de nº 8 (Estado de São Paulo), que regram o trabalho desses órgãos durante o período de quarentena.

Como recomendação para a manutenção dos trabalhos nos canteiros de obras, o dirigente sugere o comunicado assinado pelo SindusCon-SP, Seconci, Sintracon, com apoio do Secovi-SP. “Esses espaços podem manter o funcionamento, desde que sigam as regras de higiene e convivência estabelecidas pelas entidades”, destacou.

Quanto às obras dos clientes em loteamentos fechados e com acesso controlado, ele sugeriu que os loteadores consultem as regras das prefeituras onde estão localizados os empreendimentos.

Comportamento do mercado – Fábio Tadeu Araújo, CEO da Brain Inteligência e Pesquisa, empresa que desenvolve a pesquisa de comportamento de mercado de loteamentos, em parceira com Aelo e Secovi-SP, no Estado de São Paulo e no Brasil, apresentou os resultados do setor no ano de 2019.

No ano passado, foi percebido um aumento da representatividade das regiões Norte e Nordeste do País no volume de lançamentos de lotes. Contudo, 80% de toda a produção estão concentrados nos Estados de São Paulo e Minas Gerais. Os loteamentos abertos despontaram com 75% do volume de lançamentos e o mercado de lotes populares é o mais aquecido.

O resultado das vendas de lotes nas cidades pesquisadas no País é de 72 mil lotes. “Esse mercado é muito grande”, disse Tadeu Araújo.

O mercado encerrou 2019 com pouco mais de 78 mil lotes em estoque, contra as 90 mil unidades de 2018. “O mercado está menor, e se nada mais for lançado neste ano, levaríamos 13 meses para vender essas unidades ofertadas”, explicou.

Ele lembrou que todos aguardavam um excelente 2020 e que esse cenário tende a não mudar, mas sim ser postergado.

O mercado de loteamentos em São Paulo tem apresentado estabilidade desde que a pesquisa começou a ser realizada, em 2015, com a média de lançamentos de 35 mil unidades. O volume de VGV (Valor Global de Vendas), no entanto, tem apresentado queda, o que demonstra mudança nos valores dos produtos vendidos.

O segundo semestre de 2019 foi o melhor em termos de vendas, e os resultados completos podem ser acompanhados no Anuário do Mercado Imobiliário – 2019, disponível para download.

De acordo com o CEO da Brain, de dezembro de 2017 a dezembro de 2019, a oferta caiu de 58 mil para 41 mil lotes. “Isso mostra claramente o cenário positivo do setor.”

Questões legais – Luís Paulo Germanos, advogado e vice-presidente da Aelo, apresentou relevante análise jurídica para o setor. Ele falou da teoria da imprevisão, resguardada pelo Código Civil nos artigos 317, 478 e 479, e destacou o artigo 317 da mesma lei, que pode permitir ao juiz calibrar com desproporcionalidade o julgamento, caso considere a prestação onerosa para uma das partes, com possibilidade de desequilibrar as relações.

Germanos falou, ainda, sobre o Direito Consumerista e que o Código de Defesa do Consumidor é claro ao referenciar que, na hipótese de onerosidade excessiva, sem citar fatos imprevisíveis, privilegia-se a manutenção do contrato e o seu cumprimento. “Não se pode aplicar o Direito de maneira fria. Uma decisão que pode privilegiar o consumidor vai prejudicar o setor produtivo, que faz movimentar outros setores da economia, dando a ele uma sentença de morte”, ressaltou.

Livre negociação – Para o advogado, agora é o momento de o setor imobiliário provar que tem capacidade de se autorregulamentar. “As partes declaram autonomia de vontade. Não se deve aceitar a interferência de um terceiro ente, no caso, o Estado. Deve-se trazer os casos para a livre negociação, com solução doméstica, sem interferência externa. “É claro, disse ele, que não serão solucionados 100% dos casos, mas, com o uso de boa-fé, legalidade e transparência, a maioria será solucionada. Os empresários devem fazer o trabalho de negociador e, ao mesmo tempo, cobrar sensibilidade do Judiciário na hora do julgamento daqueles casos que não forem acordados”, destacou Germanos.

Quanto aos possíveis atrasos de obras, ele recomendou que, perante os parceiros, seja o consumidor ou o poder público, seja evocado o caso fortuito e de força maior para se concluir as obras, sem que haja responsabilidade de culpa e mora, inexistentes neste momento. “É evidente que muitos não conseguirão manter o ritmo de suas obras e serão afetados com atrasos. Deve-se, principalmente, demonstrar boa-fé e excludente responsabilidade do empreendedor”, orientou.

Associações – Mariangela Machado, diretora de Associações em Loteamentos e Bairros Planejados da vice-presidência de Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente do Secovi-SP, esclareceu que as associações, antes de restringir ou autorizar a continuidade de obras em lotes, devem seguir as determinações dos municípios, quer seja para obras de responsabilidade direta das associações, quer para aquelas dos proprietários. “Na cidade de Santa Isabel, a prefeitura só permite a entrada de moradores”, exemplificou.

Ela disse que as restrições e a paralisação de obras são medidas que podem ser tomadas sem a necessidade de decisão em assembleia. “Se os dirigentes das associações entenderem que é o melhor a ser feito, podem decidir sem a realização de assembleia. A própria quarentena e o alerta dos organismos federal e estadual são para que se evitem aglomerações, como obras e usos de espaços públicos. As associações podem, inclusive, solicitar que não se usem quiosques, parques e quadras de esporte. Neste momento, os dirigentes das associações são os prefeitos”, comparou.

Outro item destacado por Mariangela foi a redução do valor da taxa associativa durante esse período. De acordo com ela, deve-se ter cuidado, porque devem ser cumpridos tanto o orçamento quanto as despesas ordinárias, aquelas que são essenciais. “O ideal é preservar o valor e a cobrança das taxas, a fim de cumprir com essas despesas.” É recomendável o adiamento de investimentos, se forem possíveis, e que tal medida seja comunicada aos associados, mostrando quais investimentos podem ser adiados. “Passada a pandemia ou a quarentena, a nossa sugestão é que os meses em que não houve cobrança sejam divididos pelos meses subsequentes. Isso pode ser feito sem aprovação em assembleia”, destacou.

Mariangela foi bastante clara quanto a não se realizar assembleias e citou a Medida Provisória 931/2020, que prorroga o prazo vencido dos mandatos de dirigentes das S/A por sete meses. “Podemos usar essa medida como analogia. Se houver a opção por assembleias virtuais, é preciso confirmar com o cartório se há a possibilidade de registrar atas virtuais e a assembleia digital deve ser válida, tendo a retaguarda de uma administradora, com o uso dos sistemas corretos e com votos criptografados”, concluiu.

Alertas – Lair Krähenbühl, conselheiro do Secovi-SP, deu algumas dicas e recomendações, como a necessidade da livre negociação, comportamento que sempre prevaleceu nos períodos pós-guerra, para se evitar ao máximo a judicialização e, assim, a emissão de sentenças capazes de descaracterizar as relações de consumo. Outra dica foi a de produção antecipada de provas, principalmente para os casos que envolvam prazos (leilão, mora etc.).

Krahënbühl apresentou, em meio a tantas preocupações, a oportunidade para o setor de loteamento requerer ao BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) a inclusão de loteadoras como beneficiárias da linha de crédito destinada às pequenas e médias empresas que executam infraestrutura. “Isso pode ajudar a diminuir o cronograma dos projetos nesse momento”, disse.

Boa-fé e negociação – Marcos Saes, diretor de Meio Ambiente da Aelo, disse que, no caso dos contratos, todos irão atravessar um período de recessão econômica comparada ao pós-guerra e que neste momento, mais do que nunca, a boa-fé tem de estar presente em todos os lados. “Não passaremos por esse momento se não houver boa-fé e negociação.”

Para ele, não há dicotomia em defender a vida e a economia, e que afirmações categóricas devem ser vistas com ressalva. Saes lembrou que o Brasil vinha caminhando em um processo de aprovação de reformas e que se algumas delas tivessem avançado no Congresso Nacional, o período de crise seria um pouco mais fácil de ser enfrentado. Dentre essas matérias, Saes citou a reforma Administrativa e o marco legal do Licenciamento Ambiental.

“Os órgãos ambientais não pararam e não há como os empreendedores cumprirem algumas condicionantes. Deve-se comunicar as impossibilidades transitórias, para não ser cobrado futuramente por não ter informado o órgão. É plenamente possível rever algumas condicionantes, argumentando onerosidade excessiva”, orientou.

Para ele, este é o momento de o setor renegociar alguns aspectos do negócio, como, por exemplo, o cumprimento de obras de infraestrutura em loteamentos que, posteriormente, são doadas ao poder público.

“O Poder Judiciário não é lugar para se discutir Direito Ambiental, em virtude das inúmeras subjetividades do tema. Em tempos de crise, surgem oportunistas. A tragédia de Brumadinho gerou 45 mil ações judiciais. Por isso, Secovi-SP e Aelo têm de levar adiante as negociações institucionais, para evitar o Judiciário. É hora de arrumação da casa e o mercado se regula muito bem. Essa crise é mais uma oportunidade de reinventar o setor”, destacou Saes.

Parlamento – Pedro Krähenbühl, consultor Legislativo do Secovi-SP, destacou as iniciativas que o governo federal tem estruturado, como a MP do Emprego, as medidas da Caixa, do Banco Central e a redução da contribuição do Sistema S, entre outras. “Essa ação tem sido bem recebida no Congresso, mas há pontos de atenção, como possíveis projetos que podem causar interferência do Estado nas relações privadas.”

Ele lembrou que a tributação de lucros e dividendos está voltando à pauta de discussões no Parlamento, assim como a taxação de grandes fortunas.

Disse, ainda, que se for necessário alterar alguns aspectos da Lei 6.766/1979, a fim de prorrogar prazos, é possível na esfera administrativa. “Podemos avançar com pautas represadas, como a Reforma Administrativa, e a segunda lei da Liberdade Econômica, que vai ajudar a desburocratizar o setor imobiliário. Talvez, seja a hora de o setor se organizar para enfrentar essas questões. Mas, para o licenciamento ambiental, o momento não é adequado”, disse.

Termômetro – Celso Petrucci, economista-chefe do Secovi-SP e vice-presidente da Indústria Imobiliária da CBIC, fez uma rápida apresentação do que classificou como “Termômetro semanal do mercado de loteamentos”.

O especialista explicou que 42 empresas estão participando da sondagem e destacou alguns números, como redução de 71% do interesse dos clientes pela compra do lote, neste momento; 10% de manutenção do interesse e 2% de aumento do interesse.

De acordo com a amostragem, a redução das vendas foi de 83%, e 40% dos interessados em comprar o lote fecharam negócio por meio digital. “Por maior que seja a dificuldade de atendimento presencial, o mercado continua ativo”, destacou o economista-chefe do Secovi-SP.

Caio Portugal encerrou falando do excelente momento para se levar segurança, celeridade e transparência aos processos de licenciamento de loteamentos. “Vamos preservar a atividade, cuidar dos nossos negócios e dos nossos colaboradores, aumentar o sentimento de coletivo. Somos uma única nação, e estamos aqui dispostos a trabalhar pelo coletivo. Sejam felizes e cuidem-se.”

Assista o conteúdo completo da Live de Loteamentos.​