Praça da República, na Capital, é um bom exemplo de adensamento

Em live realizada pela vice-presidência de Incorporação e Terrenos Urbanos do Secovi-SP, dia 25/6, o presidente da entidade, Basilio Jafet, falou das reuniões que têm sido promovidas com bancos, a fim de mostrar a importância da redução dos juros para o crédito imobiliário.

Conforme Jafet, em um desses encontros, a Caixa Econômica Federal anunciou a liberação de um pacote de benefícios, a ser apresentado em breve, sem a inclusão de redução dos juros para o setor. “Lamentavelmente, o spread de 5% é inaceitável e os bancos não cedem”, destacou.

Outra linha de frente em que o setor tem atuado é na desmistificação que os escritórios serão extintos, em razão do trabalho em home office intensificado pela pandemia. “Outro mito é que está havendo uma fuga das famílias para cidades do Interior. Esta não é a realidade”, esclareceu Jafet.

Comportamento do mercado – Celso Petrucci, economista-chefe do Secovi-SP, apresentou dados da Pesquisa do Mercado Imobiliário desenvolvida pelo departamento de Economia e Estatística do Sindicato. Conforme apurado, em 2019 foram lançadas, em média, cinco mil unidades por mês. Neste ano, os lançamentos contabilizam mil unidades por mês, em média. “Contudo, o movimento em torno de novos lançamentos já começa a acontecer. Hoje, buscamos entender o quanto temos de unidades aprovadas e que ainda não foram lançadas. A nossa percepção é que existem entre 40 mil e 60 mil unidades residenciais aprovadas nas prateleiras dos incorporadores. Com isso, podemos ter um junho com mais de 10 mil unidades lançadas”, apostou.

Das quase 63 mil unidades lançadas nos últimos 12 meses, até maio, as que compõem o segmento econômico e estão enquadradas nos parâmetros do programa Minha Casa, Minha Vida representaram 50%. Em valores, correspondem a R$ 29 bilhões lançados.

O preço médio lançado dos outros mercados apresentou crescimento médio de 9%. E a tendência não é de queda do preço do imóvel, conforme Petrucci.

Em relação à venda de unidades novas, em 2019 a média foi de 4 mil unidades comercializadas por mês. Neste ano, contudo, esta média caiu para 2,4 mil por mês. “Mesmo com a retração nos lançamentos e o fechamento dos estandes de vendas, as famílias permaneceram comprando a casa própria”, asseverou o economista-chefe.

O mercado de alto padrão sofreu mais que o econômico nos meses de março, abril e maio, de acordo com Petrucci. “Quase 50% das vendas são de unidades do MCMV.”

Os distratos registraram uma pequena elevação e chegaram ao índice de 7,1%. E a oferta – unidades disponíveis para venda – está abaixo de 30 mil unidades.

Petrucci ressaltou que a taxa Selic caiu mais de 80% de 2015 para cá, dentro de um cenário de crise econômica e política. O IPCA (índice de Preços ao Consumidor Amplo), por sua vez, caiu 80%. A inadimplência permaneceu, nesse período, na média de 2%. No financiamento com recursos do FGTS, o LTV (Loan-to-Value) ficou entre 63% e 70%. “O Sistema Financeiro de Habitação passou por terríveis provas nos últimos anos e mostrou força, pagamento assíduo, que traduz a importância da moradia para as famílias. Os bancos, principalmente a Caixa, tem de enxergar que a queda da taxa de juros para o financiamento na ponta é necessária. A queda de 2, 3 ou 4 pontos percentuais nos juros pode trazer milhões de famílias para o sistema de financiamento”, defendeu o economista-chefe.

Funcionamento das cidades na era das pandemias – Durante a live da vice-presidência, o ex-presidente do Secovi-SP, Claudio Bernardes, fez interessante apresentação acerca do comportamento das cidades no enfrentamento das grandes pandemias.

Um dos primeiros questionamentos propostos pelo palestrante foi sobre o que a humanidade aprendeu com as pandemias anteriores. Citou o exemplo da gripe espanhola, de 1918, que infectou 30% da população mundial e matou 50 milhões de pessoas. “Ela nos deixou muitas lições aproveitadas agora, com o coronavírus, como o uso de máscaras, a necessidade de se evitar aglomerações, o perigo da contaminação no transporte público e a importância do distanciamento social.”

Bernardes comentou uma das inúmeras pesquisas realizadas pelo MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts), segundo a qual as cidades que adotaram medidas mais agressivas de distanciamento social apresentaram maior crescimento econômico após a pandemia.

Ele lembrou, ainda, que por ocasião da gripe suína, em 2009/2010, foram colocados sensores para monitorar o comportamento de 788 pessoas, a fim de se medir a distância possível de contaminação por meio do espirro ou tosse.

Imunidade – Claudio Bernardes falou das duas formas de se superar a pandemia: imunização de rebanho, com índice de 60% a 70% de pessoas infectadas, ou vacinação. Contudo, o Brasil ainda não atingiu o índice de 20% de infectados e não há vacina para a Covid-19. “Teremos de aprender a conviver com esse problema”, disse.

Segundo ele, os ambientes urbanos facilitam a transmissão de doenças infecciosas, porque há grande interação entre as pessoas, sem o tão alardeado distanciamento social. A população, com seus valores não-tangíveis, e o ecossistema interagem entre si de forma muito complexa, conforme o ex-presidente do Secovi-SP. Essa complexidade gera amplitude dos níveis de conectividade e a ela se soma à autonomia dos agentes, que podem decidir se cumprem ou não os princípios recomendados de distanciamento social.

Contudo, as pandemias atingem com menos agressividade os núcleos urbanos, sendo mais violenta nos meios rurais, como se pode perceber na China. Mas como é impossível reverter o processo de urbanização, que só no Estado de São Paulo chega a 96%, é necessário usar as lições aprendidas, as ferramentas disponíveis e ter ideias arrojadas para o funcionamento da cidade, com abrangência e inovação, de acordo com Bernardes.

As cidades são ambientes vivos e compostos por pessoas e coisas que interagem entre si; e administrar cidades é, também, administrar esses fluxos. “Mas há fluxos invisíveis, que igualmente precisam ser administrados, como os vírus e as bactérias.”

A tecnologia pode ser usada nesse processo, por meio do desenvolvimento de sistemas digitais que possam mapear esses vírus e bactérias, de forma a permitir que os dirigentes saibam como eles estão se espalhando. Pesquisadores suíços, de acordo com Bernardes, desenvolveram biossensores capazes de captar a existência do coronavírus nos ambientes. “Esta tecnologia ainda não está disponível, mas estará em breve, e será usada a nosso favor”, destacou.

Resiliência urbana – Big Data, sensores, Internet das Coisas e vigilância digital para monitorar pessoas, coisas e vírus e algorítimos são algumas formas de usar a tecnologia a favor da resiliência urbana diante de pandemias.

Conforme Bernardes, a proximidade física perdeu um pouco de seu valor na comunicação e no trabalho por três razões: o distanciamento social descomplicou o fluxo de informações, o comércio on-line cresceu e as cadeias de suprimentos tiveram de se superar para entregar de forma confiável e rotineira. “Isso gera redução de deslocamento e interações e traz mudanças na utilização dos espaços das cidades.”

Outro questionamento apresentado por Bernardes refere-se à interligação entre volume de adensamento e aumento da contaminação. Ele menciona estudo do Banco Mundial desenvolvido na China, em 284 cidades. Após o ciclo de estabilização do volume de casos de coronavírus, descobriu-se que quanto maior a densidade, menor o número de infectados.

Na Espanha, estudo semelhante conclui que áreas com menor densidade populacional tiveram maior contaminação. Contudo, os diferentes modelos de adensamento pesam nessa conta. Em São Paulo, por exemplo, há oito mil pessoas por quilômetro quadrado, mas existem muitas diferenças sociais, que interferem diretamente na contaminação. No distrito da República, são 24 mil habitantes por quilômetros quadrados. Mas o sistema viário da região é equilibrado, as construções são regulares, com altos níveis de verticalização. Sapopemba, com 21 mil habitantes por quilômetros quadrados, está na periferia da zona Leste da Capital, tem alta densidade, domicílios com mais de seis moradores e alto índice de mortalidade e contaminação com a Covid-19.

“O tipo de adensamento está relacionado com a desigualdade social. Entre 50% e 80% das pessoas trabalham na informalidade nas cidades em desenvolvimento, como o Brasil. Esse é um problema nosso, dos cidadãos. A redução das desigualdades permeia vários fatores, e a habitação está muito ligada a isso”, destaca Bernardes.

Mobilidade – O palestrante trata a mobilidade como outro importante aspecto no combate às desigualdades. “Ela deve estar focada no acesso às atividades do dia a dia, de maneira menos perigosa para a proliferação de pandemias.”

Ele apresentou como alternativa ao problema a adaptação viária, que deveria passar por uma reconfiguração, dando mais espaço para pedestres e ciclistas, com menos espaço para carros.

Ampliação das calçadas, para aumentar as distâncias entre os pedestres, criação de zonas seguras para as filas do comércio, sem bloquear as calçadas e barreiras de proteção nas calçadas são outras formas de desenhar uma cidade mais segura no enfrentamento de pandemias.

Ruas compartilhadas com sinalização em pontos de acesso para indicar o tráfego local; ruas abertas protegidas para alimentação, com delimitadores físicos e marcações; zonas para cargas e descargas de mercadorias; rua escola, para os alunos se exercitarem; ruas de lazer e espaços para comunicação são algumas propostas apresentadas por Bernardes.

A contaminação no transporte público seria resolvida com o aumento da frota de ônibus e trens e de sua frequência ou com um verdadeiro escalonamento de horários, desenvolvido a partir do estudo de dados dos números de pessoas que usam o transporte por horário de trabalho, divididos por ramo ou setor de atividade profissional. A desinfecção desses meios de transporte, com diminuição de deslocamentos a partir da criação de núcleos de vizinhança, que contenham recursos básicos e necessários para atender a demanda da população completam a sugestão.

Para a promoção do distanciamento social em praças e parques, Bernardes mostrou várias possibilidades, como marcações no solo de áreas a serem ocupadas, sanitários ao ar livre, estação de higienização das mãos, grids de distanciamento social nos espaços históricos.

Escolas com salas-tendas, para evitar que os alunos fiquem fechados, privilegiando a circulação de ar. Remoção de lugares em teatros, para a volta de espetáculos, hotéis com serviço de check-in por celular e quarto com todos os serviços disponíveis (academia, home office etc.) são outros exemplos.

“Planejamento urbano voltado à saúde é a lição que fica para nós. Os planos urbanísticos têm de focar nos aspectos sanitários, pensando nas pandemias. Óbvio que não podemos pensar em uma cidade vivendo em constante pandemia, mas que ela tenha condições de enfrentar essas situações”, disse Bernardes, concluindo que os pensadores urbanos têm a oportunidade de sair mais forte da pandemia atual, criando uma cidade e uma sociedade que enfatize a inclusão social e a diminuição das diferenças. “As cidades são para pessoas, e as cidades que funcionam têm pessoas mais felizes.”