Código Flortestal e a segurança jurídica da atividade de loteamentos

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) retomou em 21 de fevereiro o julgamento de cinco ações que tratam do novo Código Florestal, a Lei 12.651/2012: a Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC 42) e quatro Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) – 4901, 4902, 4903 e 4937. Todas sob a relatoria do ministro Luiz Fux.

Em 2016, o relator convocou audiência pública para debater amplamente o tema. Participaram 22 especialistas, entre pesquisadores, acadêmicos, representantes do governo federal e de entidades. Numa sessão plenária realizada em novembro do ano passado, o ministro Luiz Fux proferiu seu voto, no qual analisou diversos dispositivos questionados e afastou a constitucionalidade de alguns deles. A sessão foi suspensa por um pedido de vista da presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, e agora retomada.

Das quatro ADIs ajuizadas sobre o tema no STF, as três primeiras foram apresentadas pela Procuradoria-Geral da República e a última pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL). Todas pedem a inconstitucionalidade do novo Código Florestal por variadas alegações, especialmente quanto à redução da reserva legal. Já a ADC 42 foi ajuizada pelo Partido Progressista (PP) e, ao contrário do ocorrido quanto às ADIs, defende a constitucionalidade da lei por considerar que o novo Código não agride o meio ambiente, mas tem o objetivo de preservá-lo.

Ciro Scopel, presidente do Conselho Consultivo da Aelo e membro da diretoria do Secovi-SP, preparou para o BOLETIM AELO ONLINE Nº 687 análise sobre o assunto, que reproduzimos a seguir:

“O pesquisador da Embrapa Territorial Evaristo de Miranda publicou artigo no jornal O Estado de S.Paulo do dia 16 de fevereiro com o título O STF e o Código Florestal, comentando o julgamento da constitucionalidade do Código Florestal pelo STF, em ação proposta pelo Ministério Público. Ainda prevalece no Brasil a insegurança jurídica das leis e licenças, principalmente nas questões ambientais e urbanísticas. Assim como o novo Código Florestal está sendo contestado, mesmo tendo sido amplamente discutido antes de ser votado, conforme ressalta o artigo, na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo ocorre o mesmo, com a suspensão, por meio de medida liminar, da aplicação da Lei 15.684/2015, que dispõe sobre o Programa de Regularização Ambiental no âmbito do Estado. Essa lei estadual assegurava, em seu artigo 40, parágrafo único, o direito de se construir em lotes oriundos de parcelamento do solo urbano registrado no Serviço de Registro de Imóveis competente, desde que respeitadas as Áreas de Preservação Permanente, exigidas pela legislação vigente na data da implantação do licenciamento ambiental e do registro do parcelamento do solo para fins urbanos, aprovado segundo a legislação específica. Nada mais lógico, isso é óbvio. Mas, infelizmente, não é o que pensa o Ministério Público que parece preferir o cipoal de interpretações subjetivas para deixar os empresários mais preocupados. Vamos aguardar o julgamento desses dois diplomas, torcendo para que se mantenham os textos originais e, assim, dar um pouco mais de segurança a uma atividade que assegura lotes para a construção de moradias para todas as classes sociais, que gera empregos e impostos, e que tem respeitado o meio ambiente.”

Confira alguns períodos do texto “O STF e o Código Florestal”, de autoria de Evaristo de Miranda, engenheiro-agrônomo, doutor em Ecologia e pesquisador da Embrapa Territorial, publicado no Estadão.

“Começou bem o julgamento das contestações ao Código Florestal no Supremo Tribunal Federal (STF). O ministro relator, Luiz Fux, apresentou um voto técnico e equilibrado sobre uma ação declaratória de constitucionalidade e quatro ações diretas de inconstitucionalidade. Se o seu voto, em grande parte, for seguido por seus pares, a agropecuária terá a segurança jurídica tão necessária para produzir com sustentabilidade e competitividade.

Em tempos de enfrentamentos entre Judiciário e Legislativo, o ministro Fux destacou a qualidade excepcional do processo legislativo que resultou no novo Código Florestal (tempo de tramitação, audiências públicas realizadas, votação expressiva dos parlamentares, etc.). E enfatizou a necessidade de “deferência ao Legislativo” pelo trabalho e seus resultados. Aplausos ao labor dos deputados Aldo Rebelo e Paulo Piau, nem sempre reconhecido.

(…)

Parte da insegurança jurídica do País provém do uso, por atores sociais, de uma principiologia situada acima das leis. Evocou-se o princípio da precaução para impedir pesquisas científicas. E o princípio de vedação ao retrocesso em matéria ambiental para impedir a evolução de normas. Basta a mudança não estar de acordo com interesses e ideologias de certas organizações e esse princípio é invocado, como algo acima até da norma constitucional. Foi assim no ajuste de limites de unidades de conservação: transforma-se a legislação ambiental em cláusula pétrea.

O voto de Fux foi claro: “As políticas públicas ambientais devem conciliar-se com outros valores democraticamente eleitos pelos legisladores, como, verbi gratia, o mercado de trabalho, o desenvolvimento social, o atendimento às necessidades básicas de consumo do cidadão. Desta forma, não é adequado desqualificar determinada regra legal como contrária ao comando constitucional de defesa do meio ambiente ou mesmo sob o genérico e subjetivo rótulo de ‘retrocesso ambiental’, ignorando as diversas nuances que permeiam o processo decisório do legislador, democraticamente investido da função de apaziguar interesses conflitantes por meio de regras gerais e objetivas. Deveras, não se deve desprezar que a mesma Constituição que protege o meio ambiente também exorta o Estado brasileiro a garantir a livre-iniciativa, o desenvolvimento nacional, a erradicação da pobreza e da marginalização, reduzir as desigualdades sociais regionais, proteger a propriedade, buscar o pleno emprego e defender o consumidor. O desenho institucional das políticas públicas ambientais suscita, assim, o duelo valorativo entre a tutela ambiental e a tutela do desenvolvimento, tendo como centro de gravidade o bem comum que é a pessoa humana, no cenário de escassez”.

Mais ainda: “O Princípio da Vedação ao Retrocesso não se sobrepõe ao Princípio Democrático, no afã de transferir ao Judiciário funções inerentes aos Poderes Legislativo e Executivo e nem justifica afastar arranjos legais mais eficientes para o desenvolvimento sustentável do país como um todo”.

Dos cerca de 21 dispositivos contestados, Fux declarou a constitucionalidade de 19: tratamento diferenciado para pequena propriedade rural (artigo 3.º), novas regras na definição de área de preservação permanente (artigo 4.º) e de uso restrito (artigo 11), hipóteses de redução da reserva legal (artigos 12 e 13), regularização de áreas rurais consolidadas (artigo 61-A), cumprimento da reserva legal por compensação ou doação (artigo 66) e regime diferenciado para reserva legal em áreas já ocupadas (artigos 67 e 68).

(…)

Em dois meses, o Código Florestal completa seis anos de aplicação positiva e sem as catástrofes anunciadas por alguns. O retorno do julgamento no STF está marcado para o dia 21 deste mês. É tempo de eliminar as dúvidas e acabar bem esse capítulo.”